Após a assinatura do decreto de intervenção na área de segurança pública do estado do Rio de Janeiro, em nota oficial o Partido dos Trabalhadores (PT) afirma que o ato é “perigoso e pode piorar o estado de exceção em que vive o país”. Com o decreto, o general Braga Netto assume o comando de todas as forças policiais do estado.
O líder do PT na Câmara, onde o decreto deverá ser votado na próxima segunda-feira (19/2), deputado Paulo Pimenta (RS), disse que as bancadas petistas no Congresso Nacional votarão contra o decreto por considerá-lo oportunista e ineficaz.
O ex-ministro das Relações Exteriores do governo Lula, Celso Amorim, disse que a “intervenção é um instrumento perigoso e extremo”. Segundo ele, “onde o método foi aplicado a violência não diminuiu e o narcotráfico acabou por dominar uma parte relevante do território”.
“É um instrumento perigoso, especialmente em ano eleitoral. Além disso, pelo que sei, as Forças Armadas não se sentem confortáveis em uma situação como esta”, disse Amorim.
Segundo o ex-chanceler, esse tipo de intervenção causou distorções em outros países, a começar pelo México, onde a violência não diminuiu e o narcotráfico acabou por dominar uma parte importante do território. O ex-ministro ainda aponta o risco de politização das Forças Armadas e relembra que, além do Rio de Janeiro, o Exército tem sido chamado a atuar em Roraima, por conta da forte onda de migração de venezuelanos.
“Talvez Temer queira mostrar à população que está trabalhando. No primeiro momento, é provável que a medida cause um efeito psicológico positivo, tem um sabor espetacular. O problema da insegurança é grave e ninguém é contra medidas que busquem resolver ou atenuar a situação. Mas as Forças Armadas não estão preparadas para atuar por um longo prazo na segurança interna. É uma distorção de suas funções”, arremata Amorim, que também foi ministro da Defesa no governo Dilma Rousseff.
Por sua vez, o ex-ministro da Justiça Eugênio Aragão destacou que a medida visa esconder a derrota política de Michel Temer com a reforma da Previdência. “Temer sabe que a reforma foi para o saco, então ele precisa de uma tática diversionista para de alguma forma esconder a sua derrota”.
Sobre a possibilidade de um recrudescimento militar, Aragão disse que essa situação “tem muito mais a ver com o desespero do governador Pezão, porque o estado está realmente em situação desesperadora”.
Com relação a proposta debatida no Palácio do Planalto de criação do Ministério da Segurança Pública, Aragão classificou como “factoide de mau gosto”. Ele ressalta que “a Constituição define que a segurança pública é de competência dos estados, não da União. Então, a União criar um ministério pra cuidar da competência dos estados mostra um pouco apego desse governo ao federalismo. Nós ainda não temos polícia nacional, não temos gendarmeria nacional. Mostra até a falta de estruturação jurídica desse governo”.
Eis a íntegra da nota do PT:
“O Partido dos Trabalhadores e as bancadas do PT da Câmara e do Senado receberam com surpresa e preocupação o decreto de intervenção federal no Estado do Rio de Janeiro.
A crise da Segurança Pública é um dos mais graves problemas da população do Rio de Janeiro e de todo o Brasil, especialmente da população mais pobre, exigindo participação ativa do Governo Federal.
Os governos do PT assumiram sua responsabilidade neste tema com medidas de forte impacto, como a criação da Força Nacional de Segurança Pública e do Pronasci, o fortalecimento da Polícia Federal, da Polícia Rodoviária Federal, entre outras iniciativas, como a proteção das fronteiras, com participação constitucional e adequada das Forças Armadas.
A intervenção anunciada hoje, no entanto, pode ser um perigoso passo para a consolidação e o aprofundamento de um estado de exceção no Brasil.
Este instrumento excepcionalíssimo, jamais aplicado desde a Constituição de 1988, requer o esgotamento de todas as possibilidades de enfrentamento da crise, o que claramente não ocorreu. O próprio interventor designado para assumir a segurança pública no estado, general Braga Neto, disse hoje à imprensa que há “muita” influência da mídia em torno da questão.
Desde julho de 2017, quando foi decretada a ação de Garantia da Lei e da Ordem para emprego das Forças Armadas no Rio de Janeiro (medida prorrogada em dezembro último), os governos federal e estadual não conseguiram estabelecer um Plano de Segurança Pública para o Estado, instrumento imprescindível para identificar e definir as ações a serem tomadas.
A urgência de um Plano Nacional e de um Plano Estadual para a prevenção e repressão à violência é incontornável, pois apenas por meio de tais planos se pode direcionar as ações de prevenção, inteligência e repressão, abordando, ainda, o papel dos estabelecimentos prisionais, que hoje, além de serem verdadeiras universidades do crime, fornecem mão de obra às organizações criminosas.
Não se pode afastar a relação do agravamento da crise da segurança com o enfraquecimento do estado, falido por conta de um grave ajuste fiscal, promovido pelo governo Temer e intensificado pelo governo estadual do MDB, que afeta, inclusive, verbas para pagamento de policiais e investimentos necessários para políticas de segurança mais eficientes.
A medida parece ser estabelecida para contornar dificuldades políticas do governo Temer, que enfrenta baixíssima popularidade e muitos obstáculos para aprovar a destrutiva Reforma da Previdência.
É gravíssimo o fato de o governo anunciar que pode suspender o decreto, caso tenha os votos necessários para aprovar a proposta de emenda constitucional, quando a própria Constituição Federal impede a promulgação de qualquer PEC na vigência de intervenção federal sobre um Estado. Inaceitável, sob todos os aspectos, esse novo drible à Constituição seria mais uma vergonha imposta ao país pelo governo golpista.
A direção do Partido dos Trabalhadores e suas bancadas no Congresso Nacional afirmam que o governo golpista não está realmente preocupado com a segurança da população, mas apenas com sua sobrevivência política.
O povo brasileiro, principalmente o povo mais pobre, exige e merece a participação responsável do governo federal na Segurança Pública, com programas sólidos e políticas eficazes, mas repudia ações pirotécnicas de efeitos meramente propagandísticos”.
Assinam a nota: Gleisi Hoffmann, presidenta nacional do PT; Paulo Pimenta, líder do PT na Câmara dos Deputados, e Lindbergh Farias, líder do PT no Senado.