Romário Schettino -
Há muitos protestos contra os pareceres emitidos pelos pareceristas contratados pela Secretaria de Cultura do DF para avaliar os projetos inscritos no Fundo de Apoio à Cultura (FAC). O Conselho de Cultura, que é composto por representantes dos artistas, ainda não se manifestou sobre essas graves distorções e suas consequências.
Há alguns meses o fotógrafo Luiz Humberto teve seu projeto de exposição recusado “por falta de relevância cultural”. Foi tão grande a repercussão negativa que o próprio secretário de Cultura Guilherme Reis foi obrigado a autorizar a realização da exposição apesar do FAC.
Agora, o ator, autor e diretor de teatro Alexandre Ribondi publicou sua indignação em sua página no Facebook.
“Há dois anos que os meus projetos vêm sendo barrados pelo Fundo de Apoio à Cultura (FAC) do GDF, com notas muitas baixas. Por isso, gostaria de discutir (no Facebook) alguns pontos que foram dados pelos pareceristas”, diz Ribondi.
E acrescenta: “Para a peça “Luz Intrusa”, foi dito que dar uma boa nota aconteceria em detrimento de um novo espetáculo, que abriria portas para novos artistas que dependem mais de fomento do que uma equipe com reputação”.
E não para por ai, relata o ator: “Em um outro projeto, que não é meu, e que também recebeu pontuação fraca, foi dito que, apesar das qualidades, já é hora de privilegiarem novos nomes”.
Em seguida, Ribondi argumenta: “Em primeiro lugar, gostaria que esses pareceristas me dissessem de onde tiraram a ideia de que uma "equipe com reputação", em Brasília não precisa de fomentos. Estarão dizendo que eu não preciso de dinheiro para montar peças? Além disso, esse discurso de dizer que é preciso dar espaço aos mais novos é linguagem moderninha para escamotear um preconceito esfarrapado contra a maturidade. É bom lembrar que o FAC deve se basear na qualidade dos projetos e não na idade da equipe, o que é patético”.
Sobre uma outra peça de Ribondi, “O Paraíso de Caim”, que também recebeu nota baixa, o diretor disse que no parecer está escrito que “se é uma peça sobre racismo, como pode haver apenas dois atores brancos em cena? Ora, porque o autor quis mostrar pessoas brancas expondo os seus preconceitos”. Argumento de um parecerista, que se diz apto a julgar peças de teatro, mais ridículo, impossível.
De sua parte, Ribondi, rebate: “Mas se avaliar a qualidade de um texto é opinião pessoal e subjetiva, me dá direito de resposta. Tenho? Não me parece, porque já me foi dito, cara a cara, que apresentar recurso ao Conselho de Cultura é perda de tempo, já que não se darão ao trabalho de ler. Isso é monstruoso”.
A falta de noção continua com o "ilustre" parecerista, para quem um projeto que se destina a apresentar peça para 50 pessoas por sessão é muito modesto.
É Ribondi quem responde: “Ora, sou um dos donos da Casa dos 4, espaço que tem justamente 50 lugares e que é mantido de maneira independente, numa cidade onde grandes salas estão fechadas. Portanto, me pareceu que resistir ao fechamento de salas e ter a coragem de criar um espaço mantido por nós mesmos é desmerecedor. Isso é ridículo e eu dou nota 1 sobre 10 ao parecerista”.
A postagem de Ribondi gerou grande polêmica no Facebook. Até o fechamento desta matéria, já haviam 160 curtidas e 39 comentários.
Veja alguns deles:
Luis Jungmann Girafa: “Luiz Humberto teve sua proposta de exposição retrospectiva recusada porque recebeu nota baixa no quesito, "Relevância Cultural"...ai meu sac!”.
Jose Carlos Saenger: “Brasília, descaso com a cultura, patrimônio, arquitetura etc. Triste. Desconheço esta cidade há tempos...”
Isabel Labouriau: “Já me foi dito, cara a cara, que apresentar recurso ao Conselho de Cultura é perda de tempo, já que não se darão ao trabalho de ler. Não vá nessa. Depois vão dizer "ninguém reclamou..." com aquela cara de pastel. Apresente o recurso, se eles não lerem a idiotice é deles”.
Maria Lúcia de Moura: “Isso me pareceu coisa que as equipes de censura da ditadura militar faziam. Mas, afinal, estamos em tempos de ditadura novamente, não é? Ou gente tão desqualificada não estaria sendo paga(?) para emitir opinião sobre o que não entende”.
Tina Salimon: “Está mesmo na hora de discutir critérios claros na seleção de projetos a receberem recursos públicos. Em nível federal e local. Quanto mais claros os critérios, mais transparência e mais justiça na distribuição. E tem sempre que caber recurso sim”.
Roberto Muniz Dias: “Desde quando estas justificativas foram critérios para avaliação de projetos, e se são, por que projetos ditos novos não entram? Muita subjetividade envolvida”.
Mario Salimon: “Parabéns pelo posicionamento, Ribondi!”
Ana Cristina Campos: “O Projeto de Segunda Temporada da minha página de literatura no Facebook, “Verbo Solto”, também foi recusado. Com carta de anuência de Murilo Grossi, Carmem Moretzsohn e Fernanda Cabral. Será que somos velhos e devemos abrir espaço para os mais novos porque são mais novos? Como é que a gente fica sabendo por que um Projeto é recusado no FAC? É a primeira vez que pleiteio recursos”.
Luyne Machado: “Alexandre Ribondi, sou uma admiradora de toda dramaturgia produzida por você. E certa vez me perguntei o motivo de trabalhos tão belos não estarem na Cena Contemporânea ou em outras semanas culturais da cidade. Até hoje não encontrei justificativa plausível para tamanho despeito...”
Rênio Quintas: “As suas reclamações são altamente pertinentes, mas você deveria ter feito os recursos desde a primeira ocorrência, única possibilidade de reverem aqueles absurdos que o parecerista colocou! Apresenta o recurso para esse edital, sem isso não tem como reverter! Amanhã (hoje, 19/12) terá reunião do pleno do Conselho de Cultura, às 10h da manhã! Vai lá! Parabéns! Abração”.
James Fensterseifer: "Passei seis meses estudando o mito do amor romântico e escrevi a minha versão dessa estória (que, aliás, ficou ótima). Nos últimos anos, trabalhei muito com adaptações de lendas e mitos medievais e estou bem afinado com a linguagem.
No parecer está: "Em relação ao texto, trata-se da reprodução do clássico Tristão e Isolda. O texto utilizado será a versão criada por Willian Shakespeare. O projeto não demonstrou, pelo roteiro apresentado, qualquer adaptação, inovação cênica para o clássico incontáveis vezes já encenado no Brasil" Na minha pesquisa, nunca encontrei um texto de Shakespeare sobre o mito.
Além disso, sobre minha trajetória: "O proponente é também o coordenador geral e responsável pela prestação de contas do projeto, mas apesar de sua extensa trajetória no teatro seu currículo não apresenta afinidade com a gestão de projetos." Ã?
Pelo visto, a luta contra os maus pareceres continua! Agora, a questão é saber se esses pareceristas estão realmente habilitados para avaliar projetos em Brasília. E por que não podem ser questionados no Conselho de Cultura em todos os quesitos? Há muitas dúvidas a serem esclarecidas pelo dirigente do FAC. Quem sabe até mesmo anular pareceres absurdamente ignorantes como os relatos aqui nesta matéria.
Com a palavra, o Conselho de Cultura do DF, com seus representantes da classe artística.