Paula Zimbres, bacharel em Composição, mestra e doutoranda em Musicologia (Foto: Renata Samarco/Divulgação)
Em terra firme

Antônio Carlos Queiroz (ACQ) –

Esta é a sexta e última entrevista da oitava edição do Guia Musical de Brasília, que acaba de ser publicada em forma impressa.

Paula Zimbres é uma raridade no cenário musical de Brasília e do Brasil porque raras são as mulheres contrabaixistas. Raras, fortes e lutadoras.

Quem é do ramo se lembra, por exemplo, de Carol Kaye, que tocou com os Beach Boys, Richie Valens, Nancy e Frank Sinatra; de Gail Ann Dorsey, da banda de David Bowie; de Kim Gordon, fundadora do grupo punk Sonic Youth; de Tina Weymouth, da banda Talking Heads; de Kim Deal, dos Pixies; de Meshell Ndegeocello, que já tocou com os Rolling Stones; e da incrível Esperanza Spalding, que fez parcerias com Milton Nascimento e canta em português.

Embora o contrabaixo não seja um instrumento que atraia muitos músicos, todo baixista tem emprego garantido pela razão de que qualquer conjunto precisa dele. Bruno Vaiano, editor da revista Superinteressante compara o baixo à massa do bolo se a guitarra fosse o chantilly. Ninguém comenta a massa, mas sem massa não tem bolo. Tocar a nota mais grave do acorde para sustentar a harmonia é uma das funções do baixo. Uma outra é definir e dar precisão ao ritmo. Sem baixo a música fica solta, sem chão, sem sustentação.

Trajetória - Sem músicos na família – o seu pai, Paulo Zimbres, foi o arquiteto que projetou Águas Claras – ela se interessou pela música desde pequena. Quando sua avó materna fez 60 anos, resolveu estudar piano e pediu a Paula para acompanhá-la. Resultado: ela própria começou a tomar aulas com a professora Elaine Barros, por dois anos.

Mais tarde prestou atenção na MPB, e passou a estudar violão. Perto da adolescência foi atraída pelo rock. Em vez da guitarra foi o baixo que encheu os seus ouvidos. “O som grave, sólido, firme”! Estudou baixo com Nelsinho Rios e depois Fernando Nantes. Participou de algumas bandas de rock mas voltou a se interessar por MPB e jazz. Frequentou os cursos de verão da Escola de Música, onde descobriu outro baixista, o professor Oswaldo Amorim. Na Escola, terminou o técnico, dela se tornando professora temporária por vários anos. Na UnB, cursou composição e piano, sob as orientação do professor Sérgio Nogueira Mendes.

Em 2012, lançou o primeiro álbum, Água Forte, produzido pelo grande pianista André Mehmari. Cinco anos depois, lançou o segundo, Moinho, que ela própria produziu. Desde então passou a musicar poemas (de Guimarães Rosa, Cecília Meireles, por exemplo) e a interpretar músicas de Milton Nascimento, Egberto Gismonti e Gilberto Gil.

Paula participa de um sexteto, com Cairo Vitor (violão); Renato Galvão (bateria); Thanise Silva (flauta); Pedro Tupã (percussão); e Iara Gomes (piano). Além de tocar baixo, ela também canta, uma novidade mais recente em sua carreira.

Formação - Outra de suas raras qualidades é a sólida formação teórica. Depois do bacharelado em Composição, ela fez mestrado em Musicologia, pesquisando a influência da música erudita na música popular instrumental brasileira. Sua dissertação, de 2017, tem o curioso título “Gismontipascoal: A música instrumental brasileira como releitura pós-moderna do ideal modernista”.

Quando o Guia Musical de Brasília a entrevistou, pouco antes do início da pandemia do coronavírus, no final de 2019, ela disse que estava batalhando um doutorado, não disponível na UnB, para continuar as pesquisas. Em fevereiro deste ano, anunciou que havia sido aceita pela Unicamp com um projeto sobre as formações camerísticas na música instrumental brasileira e suas relações com os ideais do movimento modernista.

Em seu perfil do Facebook, Paula comentou os problemas que enfrentou durante a pandemia. “Foi difícil acostumar a dar aula sem tocar junto, foi difícil acostumar a fazer tudo por vídeo, a ficar olhando pro meu próprio rosto na tela enquanto falo, a cuidar do tecnológico e do musical ao mesmo tempo”.

Todo mundo logo passou a fazer lives. Ela, porém, diz que relutou “em entrar no mundo das lives, e só o fiz poucas vezes, sempre por ter recebido um convite carinhoso de algum coletivo nutrido por pessoas lindas: primeiro o Festival 40 Minutos, depois o @BrasíliaSomosNós, e mais tarde o Mosaico Cultural DF”.

A vida doméstica acabou tomando quase todo o seu tempo. “Tudo estava dentro de casa, tinha crianças para ver crescer, sementes para germinar, composteira para cuidar, horta com muitos cheiros, livros para ler, instrumentos vários. E tempo - tempo conturbado, tempo desordenado, tempo nervoso, mas tempo. E nesse vir para dentro, deu tempo de encontrar novas conexões. Lembro de ler, no começo da pandemia, um texto especulando que esse período de isolamento talvez gerasse um movimento em direção ao minimalismo nas artes – fazer mais com menos recursos – e que isso poderia ser muito interessante. E realmente, ao fazer essas lives cada um teve que inventar um jeito de tocar sozinho, de fazer sua música ressoar tendo só a si mesmo. No meu caso, me apaixonei pela combinação de baixo e voz: foi o recurso que achei para minhas lives e meus vídeos, e que tem me trazido muita alegria”.

Aqui vai o endereço do site de Paula Zimbres para quem quiser acompanhar a sua caminhada: www.paulazimbres.com

 Ouça aqui uma canja, a Ladeira da Preguiça do Gilberto Gil.

 

 

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