Romário Schettino –
Ganhei de presente um livro fascinante, desses que a gente começa a ler e não para. É um romance curto, 200 páginas, escrito por um jovem escritor americano, Garth Greenwell, 41 anos. “O que te pertence” (What belongs to you), editora Todavia, leva o leitor do erotismo gay às mais profundas reflexões sobre perdas, abandonos e, sobretudo, os conflitos humanos.
A história nasce a partir de um encontro fortuito de um professor de inglês em Sófia, na Bulgária, com um rapaz de programa, Mitko, em um banheiro público do Palácio Nacional da Cultura, local destinado ao cruising, com o qual passa a ter relações sexuais. Mas não fica só nisso, eles vão se envolvendo emocionalmente até tudo se tornar impossível, desesperador e, ao mesmo tempo, apaixonante, terno, doce e amável. A narrativa leva o leitor a compreender as tristezas, as alegrias, os prazeres. É como se Eros entrasse e saísse dos corpos a cada momento.
No entanto, quem pensa que vai ler apenas a descrição de cenas de sexo gay vai se surpreender com a riqueza dos relatos de vida que envolve o narrador, sem nome, as memórias da infância, suas relações com o pai conservador e a mãe submissa e confusa em seus desejos.
Durante uma de suas viagens de trem, o narrador descreve o que vê numa criança de seis anos, que viaja acompanhada de sua avó. Seu olhar terno para aquela infância tenta imaginar o futuro do menino no Leste Europeu, onde a juventude, sem perspectiva, como a de Mitko, perambula à procura de afeto e carinho. E o pior, sem estudo e sem trabalho.
A certa altura o narrador do romance diz que “o amor não é apenas uma questão de olhar para alguém, mas também de olhar junto com esse alguém, de encarar o que ele encara”. Não deixa de ser uma maneira correta de ver o mundo, o amor e a vida.
Não é por acaso que James Wood, famoso crítico de literatura do The New Yorker, considera este um dos melhores livros de 2016. E o The New York Times proclama: “É um clássico instantâneo a ser saboreado por todos os amantes da boa ficção: o esforço de um homem gay para entender seu próprio coração”.
Essa ficção tem também seu lado autobiográfico. Greenwell nasceu em Kentucky em 1978, um dos estados mais homofóbicos dos Estados Unidos, de onde saiu para sobreviver e viver sua homossexualidade. É poeta, crítico, cantor lírico e professor. Viveu na Bulgária, onde aprendeu búlgaro e ensinou inglês.
A partir deste romance, tornou-se um dos nomes mais promissores da ficção contemporânea. Esse seu livro foi eleito um dos melhores de 2016 por mais de uma dezena de publicações mundo afora. Atualmente, Garth vive em Iowa City.
É um livro para saborear uma vez e, se possível, mais de uma vez.
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Ficha técnica:
Romance: O que te pertence (What belongs to you)
Autor: Garth Greenwell (EUA)
Tradução: José Geraldo Couto
Editora: Todavia – São Paulo - 1ª edição/2019 – 208 páginas.
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O site português Comunidade Cultura e Arte fez uma esclarecedora e importante entrevista com o autor deste livro no dia 15/7/2018, antes de sua publicação no Brasil, que pode ser lida aqui: