"A vida é de quem se atreve a viver".


Sandra: "Hoje está tudo muito certinho e muito erradão pro meu gosto nesta cidade".
Brasília, eu te amei

Sandra Crespo -

Achei legal ler a coluna "Tipo Assim..." do Sérgio Maggio, no site Metrópoles. Ele cita os dez espaços culturais inesquecíveis na história de Brasília.

O Cine Atlântida é um deles. O Maggio diz que é privilegiado quem lá assistiu à Dona Flor e seus dois Maridos, do Bruno Barreto. Pois não é que foi no Atlântida que eu vi? Cheia de emoção, claro, sobretudo porque não tinha idade.

Lá pelo final dos anos 70... Eu estava com um amigo de BH, o Wellington (que nunca mais vi) - e carteirinha falsificada, claro!

Foi no Atlântida também que, tremendamente grávida, em 1993, vi "O Fugitivo", blockbuster com Harrison Ford. Filme de ação, barulhento, e o Adriano-neném parecia nadar de peito na minha barriga pra lá e pra cá.

Teve uma hora que eu entrei em pânico, pensei que ia parir no cinema! Mas consegui ficar até o fim do filme - e o Adriano sossegou na barriga por mais um mês.

Essa, eu acho, foi a última vez em que fui ao Atlântida, sala gigante do Conic que virou igreja evangélica. (Pano rápido, porque nem sempre precisamos falar sobre Kevin).

Vou citar algumas outras lembranças do Maggio que também me tocam. O Cine Academia, que era realmente um lugar onde a gente encontrava as pessoas. Hoje não tem mais nenhum espaço assim em Brasília.

E ainda o Gate's Pub, onde meus amigos e eu dançamos muito rock, jogamos dardos e ouvimos jazz. Fui lá tantas vezes e encontrei pessoas de tantos lugares! Era bem legal.

Eu, modestamente, acrescentaria à lista o cinema da Cultura Inglesa - responsável, nos anos 70 e 80, por "aplicar" na gente filmes super-cabeças de Pasolini ("Pocilga", affff), Alain Resnais, Goddard, Fassbinder, Truffaut, Luchino Visconti...

Foi na sala da Cultura Inglesa que eu vi "Z", de Costa Gavras, numa das primeiras sessões após sua liberação pela censura. Cinema lotado, o pessoal sentado nas escadas.

Eu e dois amigos chegamos cedo e nos sentamos em poltronas. O problema é que a minha amiga, ao meu lado, dormiu de roncar o filme quase todo - era assim, ela apagava sempre que fumava um beck. Morrendo de vergonha, eu dava nela umas cotoveladas de vez em quando. Foi meio tenso.

Ainda me lembrei dos concertos Cabeças, que enchiam o Parque da Cidade no início dos Oitenta. Era bem animado.

Hoje, a cidade é outra. Está muito maior, tem várias tribos diferentes.

Agora, as pessoas me parecem meio dispersas Na Nuvem. Juntam-se pela internet, e não mais em torno de uma programação de rádio, ou lançamento de disco, que dava show na certa.

Não tem mais aquele cinema que juntava todo mundo depois do filme, para um café ou uma farra.

Tá diferente, não sei dizer se tá pior ou melhor.

Só sei que tenho saudades daqueles lugares e daquele tempo. Não porque eu era jovem ali, pois nem sempre era bom ser jovem naquela época.

O bom era ter contato com o que de melhor se fez ou fazia no mundo pensante, da Academia às manifestações artísticas.
E esse contato com O Mundo era uma experiência coletiva - os ganhos individuais vinham, digamos, como uma cortesia do acaso, uma palhinha.

Era bom também viver em meio a uma certa esculhambação, num escracho gostoso, improvisações mil que hoje seriam impensáveis. Agora tudo se reveste de uma tamanha assepsia!

O fato é que, nos dias de hoje, está tudo muito certinho e muito erradão pro meu gosto, nesta cidade.

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