Alexandre Ribondi -
O Presidente cujo nome não merece ser pronunciado deu uma entrevista recentemente a um jornal carioca, cujo nome também não precisa ser dito, em que afirma que "fala bem e que tem certa formalidade ao construir frases".
O jornalista do tal jornal até chegou a mencionar que ele, o presidente soltou, durante a entrevista, preciosidades como 'data venia' e 'não obstante'. Isso não é falar bem. É falar o que já não existe, é proferir defuntos, é querer ser aceito como culto pelos burros ao seu redor. Mas o tal presidente nem existe mesmo.
Ele, o inominável, falou da esposa, que vai ter gabinete no Palácio presidencial para comandar o programa Criança Feliz. Ela, com seu sorriso e sua beleza delicada, representa à la lettre (viram que fino? é francês…) a mulher de chefe de estado subdesenvolvido: faz programas de caridade, enquanto usa roupas caríssimas e perfumes endinheirados. Isso porque ela, assim como seu marido, não acredita em divisão de rendas.
É natural que uma mulher pode ser e se comportar como quiser: submissa, dona do própria nariz, selvagem, delicada como um botão de orquídea.
Pode até fingir ser recatada e do lar, o que acaba por ser mentira que todos sabemos porque não há mulher que, por mais de porcelana que aparente ser, não arda em lavas de vulcão no fundo do peito e das partes pudendas - o tal presidente, aliás, deve adorar essa expressão.
Mas mesmo com todo o direito de ser quem quiser ser, uma primeira-dama, nessas alturas do campeonato brasileiro, virar promotora de caridade é um retrocesso para o país diante de si mesmo e do mundo.
O homem do Palácio disse, ainda, que quando se senta à mesa com seus pares para deliberar sobre a Nação, sente-se como Carlos Magno e os Cavaleiros da Távola Redonda.
Esse erro crasso e ridículo pode ter acontecido por deslize, falta de atenção e, se foi parar na página do jornal, é porque o jornalista responsável pela matéria é profissional pífio, que nem faz ideia do que é a távola.
Nunca deve ter lido sobre o assunto e está a léguas de saber que távola é sinônimo de mesa, é the table dos ingleses, la table dos franceses.
Está tudo trocado. Os Cavaleiros da Távola Redonda são do rei Arthur que, segundo as várias lendas que vêm desde o século V, era o guerreiro defensor da Grã-Bretanha quando atacada por homens e inimigos sobrenaturais.
Já o Rei Carlos Magno, iniciador da dinastia carolíngia, existiu mesmo. No século IX, foi o primeiro imperador do Sacro Império Romano-Germânico, foi rei dos lombardos e rei dos francos. Mas nunca teve uma 'table ronde', nem cavaleiros à volta dela.
Mas por que o homem do Palácio confundiu os dois? Talvez por desprezo às lendas e mitos, já que ele deve ser homem com os pés no chão.
Ou talvez porque sua geração é francófila, e ele ainda deve se referir aos cabeleireiros como coiffeur e não como hairdresser.
Ou talvez, é interessante supor, ele receie ser visto indevidamente no cenário do grande amor nutrido pelo rei Artur pelo seu cavaleiro Lancelote (dizem que havia sexo, mas lenda é lenda).
E ninguém vá pensar que ele anda tendo taquicardias por causa de Renan, de Jucá ou outros dos seus comparsas.
Mas pode ser mesmo que ele tropeçou e quis se referir ao rei Arthur - porque, assim como ele, o golpista também servirá como base para lendas e mitos que contam a inacreditável história de quando o Brasil foi para o brejo de Avalon.
Definitivamente grave é o jornalista não ter consertado o tropeção presidencial - mas sabemos que ele nem presidente é, fala a língua pátria de maneira obsoleta e tem uma cultura rala.
O jornalista, por sua vez, é o que seus colegas de profissão se tornaram: arrivistas sociais, estrelinhas da mídia que se preocupam apenas com um lead fraco e inconsistente.
Mais importante que saber do que está falando é ter o cabelo bem penteado, a maquiagem bem feita e a roupa com corte perfeito.
Se o entrevistado tivesse dito que se sentia O Conde de Monte Cristo e os Cavaleiros da Távola Redonda, o revisor de texto que deveria existir no peito de cada jornalista não reagiria.
Isso é uma espécie de crise no jornalismo de hoje, que não só vendeu a alma em nome da fama e da glória, como o Fausto (eis outro nome que os jornalistas deveriam pesquisar).
Eles venderam cueca, calcinha e coração para se tornarem o que são hoje: bonitinhos e burros.