Romário Schettino -
Ontem fui ver o filme O Processo, que poderia até se chamar “A Vergonha Nacional”. Ou, como bem disse Bruno Carmelo, do site Adoro Cinema, a diretora Maria Augusta Ramos desvendou a “Anatomia de uma farsa”. Pensando bem, o melhor título seria "A farsa do impeachment".
Adiei o máximo essa ida ao cinema porque sabia que todas aquelas imagens tão bem registradas pelo fotógrafo Alan Schvasberb estavam muito recentes em minha memória e que, por isso, não me trariam nada de novo. Mas, engano meu, o filme está na medida certa e é fundamental para entender o Brasil de hoje, pós-golpe, que muita gente ainda insiste em chamar de impeachment da presidenta Dilma Rousseff.
As imagens de Brasília no silêncio sombrio, no caminhar trôpego da cadela no Palácio da Alvorada, o cansaço dos jornalistas e dos assessores parlamentares nos corredores do Congresso Nacional revelam ao Brasil a tristeza do inevitável.
Maria Augusta deu um tiro certo na hipocrisia, na falta de caráter dos golpistas, no cinismo de políticos como Eduardo Cunha, Aécio Neves, Cunha Lima. Está tudo lá escancarado no rosto impassível do senador Anastasia, ciente de que estava cumprindo um papel sujo para consolidar a vergonha nacional. E também na cara e nas frases patéticas de Janaína Paschoal, uma “heroína” ideologicamente falsa e igualmente sem caráter.
O filme é também para aqueles que apoiaram o golpe, pois ao sair do cinema deverão estar pensando na miséria que causaram ao país colocado no lugar de Dilma um presidente fraco, corrupto, como Michel Temer e seu bando de entreguistas, antinacionais.
O Processo é para ser visto e revisto por muitos e muitos anos. Só lamento que o nome dos personagens não esteja gravado na tela para a posteridade. Uma falha proposital da diretora que pretendeu dar ao documentário uma leitura ficcional, mas a história é tão real que aqueles lambe-botas precisariam ser identificados com seus nomes e cargos.
A plateia do dia em que fui ver O Processo aplaudiu o discurso do advogado José Eduardo Cardoso e riu das caretas forçadas da patética Janaína. Dilma apresenta-se coerente do início ao fim. Talvez por isso esteja agora em condições de se eleger senadora por Minas Gerais. Quem sabe?
Mas em dois momentos dois petistas externaram suas autocríticas. Gilberto Carvalho, ex-secretário de Governo na gestão Lula, disse que o PT no governo errou ao não fazer a reforma na Comunicação Social prevista na Constituição. Pelo contrário, o primeiro governo Lula fechou mais rádios comunitárias que os governos anteriores e também foi o governo que mais distribuiu recursos publicitários aos grandes conglomerados de comunicação do país. Reconhecimento tardio? Sim, eu acho.
A senadora Gleisi Hoffman (PT-PR), por sua vez, avaliou que o partido se distanciou do movimento social a tal ponto que não se via mais como representante daqueles que estavam nas ruas defendendo Dilma.
O filme tem lado, mas não é sectário nem bajula personagens. É seco na medida certa e sensível o suficiente para mostrar quem fez e está fazendo a história do Brasil para o bem e para o mal.