"A vida é de quem se atreve a viver".


Angélica: "Ódio, esse sentimento de alta periculosidade, de frequência vibracional zero, não alimento por ninguém ".
E por falar em ódio

Angélica Torres -

Nas últimas semanas, o ódio viralizou na pauta do jornalismo brasileiro, como material de reflexão por intelectuais de diferentes áreas.

Pude, com ainda mais clareza, verificar a obsessão que esse sentimento incita, no dia da campanha nacional "Vista-se de vermelho", promovida após a prisão de Lula, mas também em respostas a um texto, encerrado com a seguinte frase: quero é a fórmula do antídoto ao ódio, isso sim.

Pronto. Interpretaram que eu me proclamava uma odiosa cidadã de esquerda necessitada desse antídoto e reagiram como se a frase fosse uma provocação. Considerei então tratar o tema pelo lado de cá, já que os especialistas têm analisado o ódio pelo lado dos que o tornaram presença cotidiana em nossas vidas, durante e pós-golpe oficializado.

Ponho, assim, o pingo nos iis: golpistas me despertam estupefação, horror, repulsa, indignação, rebeldia, desprezo e todos os sinônimos destes vocábulos que se possam encontrar no Aurélio e no Houaiss e correlatos no Dicionário Analógico de Francisco Ferreira dos Santos Azevedo.

No entanto, ódio, este sentimento de alta periculosidade, de frequência vibracional zero, não alimento por ninguém  ̶  nem por Temer e Moro, Bolsonaro e FHC, Cármen Lúcia e Marinhos, colegas comentaristas capachos da mídia oligopólica e patos selvagens generalizados. Não prego cadeia a eles. Não farejo adversários com expressão de pitbull e jogo de corpo pronto para o ataque.

Também não desejo que morram. Que sejam jogados de aeronaves em voo. Que sejam linchados por seu egoísmo, desrespeito, insensibilidade para com os menos favorecidos, e por seus crimes de lesa-pátria ̶ até porque deverão resgatar seus carmas em vida, ninguém precisa se preocupar quanto a isso.

Desejo, sim, que percam seu todo-pretenso poder na guerra travada contra eles; que peguem suas trouxas com a rapinagem feita e desapareçam; que vão para seus paraísos fiscais, ou se preferirem para o inferno de onde vieram, e nos deixem em paz, que reconstruiremos o país, felizes da vida.

Mas não saio ofendendo e agredindo pato-lógicos, seja em protestos ou em quaisquer locais públicos. Ninguém, aliás, entre os manifestantes e ativistas de esquerda se comporta assim. A posição é de defesa, é amorosa ao Lula ̶ que é exemplo do cara gregário, conciliador, do afeto, do abraço, de jararaca-pet; era de defesa à Dilma, é de solidariedade ao PT, pela injustiça que vêm sofrendo há anos.

No máximo, gritam palavras de ordem e se ostentam cartazes e faixas com frases de defesa. Fazem virtualmente piadas, troças, ironias, poemas, artes inteligentes contra suas maldades. Discutem pletoricamente com amigos do lado adversário. E, nos grupos do mesmo solidário lado, esgotam-se os estoques de impropérios, que, aliás, lhes cabem como luvas de boxe.

Entre os que admitem odiá-los, não se conhece quem saia vociferando e armado para o ataque, para a vingança com as mãos. Não se está em posição ofensiva. Não somos salteadores, não tomamos nem destruímos nada de ninguém. Queremos é que o bem-estar social alcance os que não o têm e nunca tiveram, que os direitos de todos sejam respeitados.

Devia ser claro que tendo a fórmula do antídoto eu amaria poder espalhá-la aos odiosos. Quem odeia não sonha com antídoto ao ódio. Mas desentenderam, talvez, porque a elite e a classe média que se crê elite não costumam se enxergar e reconhecer seus próprios malévolos sentimentos.

Não parecem se tocar até hoje, por exemplo, que Cristo sofreu perseguição, tortura e morte bárbaras por pregar amor e paz. Ainda não lhes caiu a ficha de quantos notórios homens e mulheres de todos os tempos perderam a vida em defesa da humanidade. De que serve então a História senão de lições acumuladas, mas permanentemente negligenciadas?

Sei lá se algum gênio descobrirá o antídoto ao ódio num dia perdido no tempo. Se os da área médica se decidirão pela necessária busca da cura da psicopatia. Se Paulo apóstolo resolve num repente baixar sobre a cegueira dos manipulados.

Mas ao menos aspirar consciente e coletivamente por essas façanhas não faz mal a ninguém. Pelo contrário. Quem sabe ajude a dar um empurrãozinho na utopia, apesar da babel dos ferozes implacáveis.

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