Geniberto Paiva Campos(*) -
A pena não puniu um crime. Pois não havia crime a punir. A pena teve como objetivo impedir a candidatura presidencial de Lula em 2018. Foi, portanto mais uma lamentável decisão político-partidária. Simples assim.
Estamos num Estado de Exceção. No qual adentramos desde a vitória do PT em 2002. Esta é a descrição mais sucinta e fiel da infeliz decisão do TRF 4, do dia 24 de janeiro.
Confirmada a sentença, com o detalhe incrível do aumento da pena, logo me veio à lembrança a cena marcante de um filme antigo, “Glória Feita de Sangue” (Paths of Glory), de Stanley Kubrick, 1957: No julgamento de um evento da 1ª Guerra Mundial por um tribunal militar, acontece a fala de um oficial, indignado com a decisão da corte, que diz: “Neste momento, me envergonho de pertencer à raça humana”.
Todos brasileiros, homens e mulheres, deveriam refletir serenamente sobre essa decisão do tribunal gaúcho. Não como “juiz dos juízes”. No mínimo, com perplexidade e indignação.
E muita sabedoria política. E ações concretas no campo jurídico. E político. E econômico. Aqueles que defendem os princípios democráticos e o estado de direito como valores perenes, não podem aceitar passivamente a injustiça de uma condenação sem provas.
Isso depõe contra o processo civilizatório, a maneira correta do convívio humano. E este não é um caso isolado.
Desde o início do 1º governo do PT, em 2003, já era nítido o inconformismo da elite com a forma diferente de governar do Partido dos Trabalhadores. Daí o nascimento do “Mensalão”.
Foi quando o velho e infalível tema da corrupção foi novamente trazido para a cena política. E a consciência crítica dos brasileiros fez apenas cara de paisagem. Como sempre, o objetivo da elite – às vezes disfarçado, ou escancarado, como agora - é estabelecer o absoluto controle da “soberania popular”. Podemos votar em qualquer candidato. Desde que seja eleito o da confiança da elite.
Governos populares ou trabalhistas. Que defendam a soberania nacional. Ou que lutem para fazer o Brasil cumprir sua vocação de “grande potência” não poderão sobreviver. Novamente, simples assim. Ou golpe ou impeachment.
Muda o enredo da peça. E os pretextos. Mas o final é sempre o mesmo. Sem direito a “happy end”. O remédio da Elite para conter avanços da democracia vem sendo aplicado numa enfadonha e conhecida sequência histórica: Getúlio Vargas, do “mar de lama do Catete”; João Goulart, da “república sindicalista”; Lula da Silva do “Mensalão”, (o qual só colou parcialmente); Dilma Rousseff das “pedaladas fiscais”.
E o próximo, ainda sem nome e sem data de início do mandato. Claro, na (talvez vã) expectativa que ocorram as eleições presidenciais de 2018. Fica cada vez mais evidente que o problema não reside na “unidade das esquerdas”. Mas no apego da elite ao autoritarismo. A doença incurável da direita.
A elite brasileira não aceita a democracia, a liberdade, a busca pela igualdade e justiça social. Tem os olhos presos, e vive, ainda no passado escravocrata. E quer a divisão eterna entre a Casa Grande e a Senzala.
A luta é essencialmente política. E se trava em diversas áreas, táticas e estratégicas. No momento atual, a prioridade é no campo jurídico.
A consciência de legalidade e justiça dos brasileiros não pode permanecer sonolenta e no estado de letargia em que se encontra há muito tempo. Desde os primórdios do “Mensalão".
Devem ser despertados desse sono mortal os "homens da lei", os intelectuais, acadêmicos, militantes de causas sociais, os cidadãos e pessoas de boa vontade. E os partidos políticos, de todas as tendências.
E fazer refletir os que se vestem de amarelo, saem as ruas e batem panelas “contra a corrupção”. Agindo contra o seu futuro.
Fica difícil, neste momento, imaginar “sangue nas calçadas”. Repetimos: a luta é política. A elite escravocrata, com a cumplicidade da classe média, defende, de forma disfarçada - e muitas vezes cínica- os ricos e os muito ricos. E não se trata de um padrão brasileiro de conduta.
O poder de manipulação da elite é imenso. E na maioria das vezes o inimigo da democracia, dos direitos humanos e da liberdade é um sujeito oculto, distante. E se espalha pelos mais insuspeitos lugares.
Tornou-se evidente, portanto, que a manipulação e a invenção de crenças não é uma característica da ingenuidade inata dos brasileiros ou latino americanos. E não depende do grau de desenvolvimento econômico e cultural de povos e nações.
É possível, sim, construir “verdades” e manipular sentimentos e reações das pessoas, de todos os quadrantes do planeta. Nesse sentido, é fundamental o papel dos órgãos de comunicação. Despidos de qualquer consideração de ordem ética. E sem nenhum escrúpulo. Dispostos a mentir e falsear a verdade. Eis um dos inimigos principais da liberdade e da democracia.
Eles comemoraram, com indisfarçada alegria, a condenação do ex-presidente Lula às penas da lei... Aproveitem, rapazes, sua festa está próxima do fim. O golpe de 2016 vai soar como um réquiem para vocês.
O neoliberalismo não se sustenta! E não deu certo em nenhum lugar do mundo.
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(*) Geniberto Paiva Campos é membro do Instituto de Estudos Brasileiros (IEB) e do Coletivo Lampião.