Romário Schettino -
A infeliz e inoportuna Resolução 706/2017, do Conselho Nacional do Trânsito (Contran), vem causando indignação. Para os ativistas da paz no trânsito, essa medida estimulará ainda mais o ódio dos motorizados contra os pedestres e ciclistas, a parte mais frágil na insana luta pela sobrevivência urbana.
Uma nota pública, assinada por dezenas de entidades defensoras dos pedestres e ciclistas em todo o Brasil, declara a insatisfação do movimento com a Resolução, que pretende ser implementada em abril de 2018.
“As multas de trânsito, previstas na legislação brasileira, são ferramentas importantes para promover o respeito à sinalização e à regulamentação de trânsito”, diz a nota, “mas para tanto, é essencial que a sinalização esteja adequada às necessidades mínimas do trânsito de pessoas e veículos, e suficientemente clara para a correta interpretação dos cidadãos e cidadãs, tanto condutores como aqueles que utilizam os modos ativos de deslocamento – também conhecidos como não-motorizados”.
Não há como penalizar pedestres e ciclistas sem uma mudança radical na cultura da velocidade, do desrespeito aos cidadãos não-motorizados e sem as condições mínimas de mobilidade urbana, com calçadas decentes, ciclovias adequadas, faixas de pedestre bem sinalizadas e outras medidas.
Os ativistas da mobilidade cidadã afirmam na nota oficial que a “largura das ruas, a configuração dos cruzamentos e até os tempos dos semáforos foram planejados a partir da lógica dos veículos motorizados”. (foto de Uirá Lourenço)
Em Brasília, segundo a Associação Andar a Pé, o trânsito dos carros é estimulado pelo desenho da cidade, que estabeleceu vias de trânsito de grande velocidade no centro urbano.
Como exigir que o pedestre se utilize de passagens subterrâneas em Brasília, conforme prevê o artigo 254 do Código de Trânsito Brasileiro (CTB), se o poder público não oferece condições mínimas. As faixas de pedestre, que são o orgulho do Distrito Federal, não são respeitadas e muitas delas não têm sequer pintura, além de estarem excessivamente distantes uma da outra.
Com o aumento dos atropelamentos com morte de ciclistas e pedestres, está de volta a campanha pela redução da velocidade no Eixão para 60km e 50km nos Eixinhos, com semáforos e faixas de pedestre. A mesma necessidade é vista como fundamental em todas as cidades do DF. (Foto de Uirá Lourenço).
“A aplicação de multas a pedestres e ciclistas não se apresenta como uma solução efetiva para resolver os problemas da mobilidade urbana e da convivência nas ruas”, dizem os ativistas.
A invés de multas, por que o governo não pensa em campanhas educativas? O que dá a entender é que o Contran prefere estabelecer a indústria da punição, indo na contramão da paz no trânsito desejada por todos os defensores da cidadania plena.
Uma maneira de barrar essa absurda Resolução é articular a aprovação de um Decreto Legislativo no Congresso Nacional. Ou, se não der certo, partir para a desobediência civil e provar que a Resolução, além de injusta, inoportuna, inadequada, é inóqua.