Rafael Matoso –
Uma grande programação virtual, gratuita e coletiva celebra os subúrbios e suas belas histórias e manifestações. Pelo segundo ano consecutivo, um grupo se reúne em torno de um ideal comum para mostrar o grande potencial e a pluralidade das manifestações artísticas, culturais e intelectuais dos subúrbios cariocas. A programação completa pode ser vista nas redes do Viradão, Instagram @viradaosuburbano e Facebook Viradão-Cultural-Suburbano. Até amanhã, 22/11, domingo.
Essa história começou com uma grande mobilização de agentes, ações e coletivos suburbanos, que decidiram não ficar esperando o poder público, e realizaram, em 2019, a primeira edição do Viradão Suburbano. Nos dias 9 e 10 de novembro do ano passado, um grande evento ofereceu arte e cultura, durante 36 horas, sem parar. O primeiro Viradão foi dedicado a Dona Ivone Lara e a Paulo da Portela, e realizamos dezenas de reuniões itinerantes e também virtuais. A ideia sempre foi construir toda atividade de maneira horizontal, plural e coletiva, em busca da maior representatividade local e da adesão popular.
Agora chega a hora de aproveitarmos o Segundo Viradão Suburbano, inicialmente previsto para seguir os mesmos moldes do primeiro, com atrações culturais espalhadas pelos subúrbios. Entretanto, por conta da pandemia e para evitar aglomerações, este ano o festival será inteiramente virtual. Começando nesta sexta-feira, dia 20 de novembro, com uma série de atividades em comemoração ao feriado da Consciência Negra. A partir das 18h teremos palestras, apresentações musicais, debates e exibição de filmes.
Até amanhã, domingo, 22 de novembro, ainda teremos muitas atrações, entre elas, uma generosa contribuição do recém-vencedor do Grammy Latino de Melhor Álbum de Samba, o grande mestre suburbano Cláudio Jorge (na foto, abaixo), que levou o prêmio com seu magnífico trabalho Samba Jazz, de Raiz. A extensa programação conta ainda com nomes como Lazir Sinval, Robertinho Silva, Paulão Sete Cordas, El Efecto, Alan Rocha, Marquinhos de Oswaldo Cruz, entre muitos outros.
Em sua origem latina, a palavra cultura significa cuidar, tomar conta, se apropriar de algo que não precisa ser necessariamente material. Hábitos, crenças, tradições e vivências históricas que produzem signos e formas de sociabilidade geradoras de identidades.
No Viradão passado, durante o encerramento da mesa Histórias e Sociabilidades Suburbanas, com o professor Luiz Antônio Simas, endossávamos o quanto os subúrbios foram capazes de produzir, ao longo da história, laços de sociabilidade e culturas associativas que são extremamente potentes até os dias de hoje.
A cidade do Rio de Janeiro, pelo menos desde a chegada da família real portuguesa ao Brasil, em 1808, passa por constantes transformações urbanísticas. Entretanto, a maioria de seus habitantes ainda continua a penar com falta de condições dignas de moradia e amplo acesso à cultura, à educação, à saúde e ao transporte de qualidade. Vejamos um exemplo. Embora atualmente cerca de 80% das cariocas e dos cariocas morem nas zonas Norte e Oeste da cidade, apenas pouco mais de 20% dos investimentos na Cultura são destinados a essas regiões. Já as zonas Centro e Sul, onde reside a menor parte da população do Rio, ficam com a maior fatia do bolo, como é possível perceber.
Embora convivendo neste contexto de negação institucional, o povo dos subúrbios resistiu e fez surgir, com engenho e arte, por exemplo, as escolas de samba e outras inúmeras formas de expressão cultural, as quais têm, nos dias de hoje, os coletivos culturais como articuladores fundamentais nesses territórios. Na intenção de contribuir com a valorização da potência cultural existente nos subúrbios – e também de contestar a lógica fomentada por narrativas que os associam quase que única e exclusivamente a lugares marcados pela carência e violência –, é que foi criado o Viradão Cultural Suburbano. Uma construção coletiva, composta por pessoas com formações diversas, suburbanos de nascimento ou de coração. Elas pertencem a instituições, coletivos e/ou associações com histórico de atuação nos subúrbios, e que têm em comum o interesse pelas manifestações culturais próprias desses lugares.
Na abertura do evento, na sexta-feira (20), a partir das 18h, parte dos organizadores contaram como surgiu a ideia de realizar o festival. Na sequência, houve o debate “Vidas Negras Importam”, ao vivo, com a presença da deputada estadual Mônica Francisco (PSOL-RJ) e de Marcelo Dias, coordenador nacional do Movimento Negro Unificado, entre outros.
Já neste sábado (21), além da apresentação de trabalhos acadêmicos, promovida em parceria com o Diálogos Suburbanos, destaca-se também a apresentação da banda de rock El Efecto. Abrindo o domingo (22), último dia do evento, será exibido o curta “100% Suburbano” que conta um pouco da história desse outro coletivo que compõe a coordenação do Viradão. Na sequência tem roda de choro e jazz (aqui dependemos do Nunuka).
Convidamos a todos para participar, lembrando que o Viradão Cultural Suburbano é uma obra em construção que só se torna possível por meio da participação de uma rede de relações formadas nas práticas cotidianas de lutas e vivências suburbanas.