A organização do 52º Festival de Brasília do Cinema Brasileiro, que será realizado de 13 a 22 de setembro, no Cine Brasília, já começa com sérios problemas de entendimento entre cineastas e o secretário de Cultura do DF, Adão Cândido.
Duas entidades se manifestaram por meio de carta aberta à população denunciando autoritarismo do secretário: Convergência Audiovisual e Coletivo Mulheres do Audiovisual (MAV-DF) contestam afirmações da matéria publicada no site da Secretaria de Cultura, no dia 15 de abril.
A nota da secretaria informa que “representantes da sociedade civil Anna Karina de Carvalho, Marcus Ligocki Júnior e Tiago Belloti, a subsecretária de cidadania e diversidade cultural, Érica Lewis, e o coordenador de audiovisual, Wanderlei Silva – curadores – receberam oito entidades – ABCV, Aprocine, Coletivo Mulheres do Audiovisual, DF+DOC, Cora, APBA, UnB e Convergência Audiovisual. Também participou como convidado o cineasta Vladimir Carvalho”.
As cartas que se seguem foram publicadas nas página do Facebook dos cineastas Silvino Mendonça e Erika Bauer:
“Carta Aberta sobre o 52º Festival de Brasília do Cinema do Cinema Brasileiro.
Nós, Convergência Audiovisual do DF, somos um grupo que se formou de forma autônoma pela defesa de políticas públicas efetivas voltadas ao cinema e à cultura no Distrito Federal.
Fomos surpreendidos na última quarta-feira, 17 de abril, com uma publicação no site da Secretaria de Cultura do DF dizendo que a atual edição do Festival de Brasília do Cinema Brasileiro conta com o apoio de nosso grupo, entre outras associações. Essa declaração não corresponde com a realidade. Pelo contrário, nossa posição tem sido de apontar a falta de legitimidade da atual Secretaria, comissão curatorial e modelo de evento, construída a portas fechadas sem um verdadeiro diálogo. É para apresentar o panorama desse contexto que escrevemos esta carta.
Em 14 de fevereiro de 2019, aconteceu uma reunião entre a Secretaria de Cultura e associações/coletivos de profissionais do Cinema do Distrito Federal para discutir os rumos do Festival de Brasília do Cinema Brasileiro.
Nós, Convergência Audiovisual do DF, estivemos presentes. Apesar do desejo inicial de colaboração das associações/coletivos, essa reunião foi considerada um fiasco pela grande maioria dos grupos representados ali.
Antes mesmo do encontro, a drástica alteração do modelo do festival já havia sido pré-definida e um integrante de sua comissão curatorial anunciado. O que deveria ser um espaço para diálogo entre o governo e a sociedade civil foi, na verdade, em direção oposta.
O secretário de cultura Adão Cândido chegou à reunião com ideias pré-concebidas de como um Festival de Cinema deveria ser, sem apresentar qualquer justificativa para a alteração radical de um modelo, em construção, elogiado por grande parte dos profissionais da área no Brasil.
A quem interessa e de onde vieram essas ideias de alteração decididas antes de qualquer diálogo?
Além disso, o secretário trouxe repetidas vezes acusações de que qualquer representante que propusesse outras ideias ou a manutenção de conquistas de anos passados teria, em suas palavras, “perdido a eleição”. Nesse momento, protocolamos uma carta em que ressaltávamos a preocupação com o tom autoritário e, mais do que isso, com o abandono do caráter público do Festival de Brasília em prol de interesses privados pouco claros.
Em abril, fomos convidados para uma segunda reunião de discussão, agora com a comissão curatorial definida. As escolhas haviam sido feitas de maneira totalmente oposta ao que nós e outras associações/coletivos havíamos sugerido – uma direção e curadoria plural nos quesitos raça, gênero, regionalidade e formada por pessoas com experiência na área de curadoria. O desejo dessa reunião parecia ser de conciliação, uma saída fácil, já que agora os caminhos estão traçados e segue não havendo possibilidade de colaboração da sociedade civil e de profissionais do setor na estruturação do Festival.
Para que serve esse falso diálogo? A resposta veio na quarta-feira, 17 de abril. Serve para distorcer os fatos e colocar grupos como o nosso como “apoiadores”, buscando legitimar um processo que criticamos desde os primeiros sinais de que a intenção não era ouvir a classe.
O Festival é antes de tudo do Cinema Brasileiro, não de uma gestão passageira, e esse fato não pode ser ignorado. Políticas se constroem ao longo de anos, à base de lutas e dissensos, e não da noite para o dia em conversas a portas fechadas. A ausência de uma construção ampla e nacional com curadores com olhar diverso, nos parece um grande retrocesso no caminho de qualquer pretensão de pluralidade. Perde o cinema nacional, perde o cinema do Distrito Federal.
Distrito Federal, 23 de abril de 2019”.
Assinado: Convergência Audiovisual DF”
Manifesto do grupo Mulheres do Audiovisual do DF (MAV-DF)
“Nós, do Coletivo Mulheres do Audiovisual do Distrito Federal (MAV-DF) estamos vindo a público para repudiar matéria publicada no site da Secretaria de Cultura do GDF (Secult), no dia 17 de abril, que vincula o nome do nosso coletivo entre os apoiadores da próxima edição do Festival de Brasília do Cinema Brasileiro.
O Coletivo MAV não esteve presente na reunião ocorrida no dia 15 de abril com a Comissão Curadora indicada pela nova gestão, pois considera que os nomes ali presentes ignoram os perfis sugeridos pelas associações do audiovisual com que nos alinhamos, quais sejam: perfis de curadoras e curadores com currículo de publicações sobre cinema nacional e contemporâneo, com contatos e participações em importantes festivais nacionais e internacionais, com representantes de diferentes partes do país, não apenas de Brasília, e que espelhem a diversidade da produção audiovisual brasileira.
O Coletivo MAV esteve presente na reunião do dia 14 de fevereiro, da qual saiu com a certeza de que a atual Secretaria de Cultura não quer construir um diálogo real com o setor. Além de o secretário Adão Cândido classificar o FBCB como um evento irrelevante (uma breve visita à curadoria das últimas duas edições mostra que as obras ali presentes tiveram ótima circulação dentro e fora do país), vimos nossas demandas serem desprezadas.
Poucos dias antes dessa mesma reunião, fomos surpreendidas com a nomeação de um integrante da comissão curatorial do evento, o que, por si só, torna irrelevante e falaciosa a reunião que trataria justamente de discutir nomes para uma possível curadoria/direção artística.
Diante dos fatos apresentados, só nos restou a triste conclusão de que a atual gestão da Secult não está interessada em ouvir verdadeiramente os coletivos e as associações do audiovisual da cidade, mas apenas utilizar nossos nomes - com muita má fé - para dar respaldo às decisões que são tomadas de forma unilateral.
Em vista disso, solicitamos a retirada da MAV-DF da citada matéria e do grupo de trabalho relativo à próxima edição do FBCB”.