Antônio Carlos Queiroz (ACQ) –
Há 40 anos morria em Paris, aos 75, o grande Jean-Paul Sartre, companheiro da Simone de Beauvoir.
Diferentemente de Foucault, que no fim da vida viria a namorar o neoliberalismo (segundo documentou Daniel Zamora Vargas, professor assistente da Universidade Livre de Bruxelas), Sartre declarou que o marxismo é a “filosofia insuperável de nosso tempo”, admitindo que o existencialismo era uma ideologia dentro do marxismo. “Enquanto interrogação sobre a práxis, a filosofia é ao mesmo tempo uma interrogação sobre o homem, quer dizer, sobre o sujeito totalizador da história”.
Em 1973, lembra o Zamora Vargas, Sartre fundou o jornal radical Libération, que hoje nem se dignou a lembrar o fato. Au contraire, publicou uma longa entrevista com o senador conservador dos Républicains, Bruno Retailleau, defensor da cloroquina…
Homem público, corajoso, defensor da liberdade como poucos (“Estamos condenados a ser livres”), Sartre foi acompanhado por 50 mil pessoas no seu féretro.
Sartre costuma ser lembrado por uma frase dúbia pinçada de sua peça de teatro “Huis Clos” (Entre Quatro Paredes), “L’enfer c’est les autres”, como se os outros fossem infernais, e não você mesmo, voltado apenas pro seu próprio umbigo. Como esclareceu Sartre numa entrevista a John Gerassi, em dezembro de 1971, “o inferno é a atomização, a incomunicabilidade, o egocentrismo, a sede de poder, de riquezas, de glória. O paraíso, ao contrário, é muito simples – e muito duro: consiste em cuidar dos outros. E isso não é possível de maneira regular a não ser no seio de uma coletividade”.
Ah, que saudade da época, ali por volta de 1973, em que eu, adolescente pré-marxista, morando em Anápolis, Goiás, ia a Brasília e passava numa livraria da 102 Sul, Ao Livro Técnico, para comprar a última edição dos “Temps Modernes”, a revista que o Sartre fundou com esse nome, inspirado no filme do Charles Chaplin.
Que tempos aqueles, em que alguns dos nossos companheiros e companheiras, como o Hamilton Pereira, eram seviciados nas prisões apenas por semear esperanças. E elas brotavam aqui e ali, contrariando a ordem dos gafanhotos!