Romário Schettino –
O Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro (TJ-RJ) sorteou segunda-feira (28/9) cinco desembargadores e a Assembleia Legislativa elegeu ontem (29/9) os cinco deputados que farão parte do tribunal misto que vai julgar o impeachment do governador afastado Wilson Witzel. O tribunal, que será comandado pelo desembargador Cláudio de Mello Tavares, presidente do TJ-RJ, será instalado na próxima sexta-feira (2/10).
Os juízes escolhidos foram: Teresa de Andrade Castro Neves, José Carlos Maldonado de Carvalho, Maria da Glória Bandeira de Mello, Fernando Foch e Inês da Trindade Chaves de Melo.
A Assembleia Legislativa do Rio (Alerj) também elegeu os seus cinco representantes no Tribunal Misto. Foram eleitos os deputados Alexandre Freitas (Novo), com 55 votos; Chico Machado (PSD), com 54 votos; Waldeck Carneiro (PT), com 51 votos; Dani Monteiro (PSol), com 37 votos e Carlos Macedo (Republicanos), com 34 votos. Os parlamentares eleitos formarão o colegiado junto com outros cinco desembargadores sorteados pelo TJRJ.
O deputado Anderson Moraes (PSL) também recebeu 34 votos, mas o eleito foi Carlos Macedo pelo critério de desempate, que considera o vencedor o parlamentar mais idoso. O resultado da votação foi comunicado ao TJRJ e a instalação do Tribunal Misto.
Os deputados estaduais do Rio votaram quarta-feira (23/9), por unanimidade (69 sim, 0 não), pela continuidade do processo de cassação do governador Wilson Witzel (PSC). O único deputado que não votou, por estar de licença médica, foi o democrata cristão João Peixoto. Witzel já está afastado do cargo pelo Superior Tribunal de Justiça (STJ) desde o dia 28 de agosto, e, assim que a comissão mista for formada e notificada, deverá ser afastado por mais 180 dias.
A resolução aprovada teve como base as provas colhidas nas operações Favorito e Placebo, conduzidas pelo Ministério Público Federal, sobre denúncias de irregularidades e corrupção na área da saúde do governo Witzel.
O governador não foi ao plenário, mas fez sua própria defesa por videoconferência. Visivelmente descontrolado, Witzel falou em traição, invocou Tiradentes e Jesus Cristo, “que foram delatados”, e lamentou estar “sendo vítima de um julgamento injusto”. Citou até o acadêmico Merval Pereira quando quis mencionar pensamentos sobre “tirania” em regimes autoritários. Ao partir para o ataque, Witzel chamou o plenário do Legislativo de “omisso” e disse que “governou sozinho durante a pandemia”. Os deputados disseram que seu governo foi “incompetente”, “genocida”, “dominado pela roubalheira” e que ele “tinha sangue nas mãos”.
Witzel jura que nunca defendeu a extrema-direita, embora tenha participado de comícios com candidatos bolsonaristas que destruíram uma placa em homenagem à vereadora Marielle Franco (PSol), brutalmente assassinada no centro do Rio.
O governador conseguiu um fato inédito na política, nenhum deputado saiu em sua defesa, nem mesmo os do seu partido, muito menos os bolsonaristas, antigos aliados. Isolado e derrotado, em breve terá que deixar definitivamente o Palácio Laranjeiras, residência oficial do governador afastado.
Todos os deputados estaduais criticaram duramente o governador. Waldeck Carneiro (PT), (na foto, abaixo), lembrou que “mais uma vez o palácio Guanabara se vê envolvido nas páginas criminais. Os indícios são robustos, seja em relação a desvios, falcatruas e maracutaias envolvendo duas organizações sociais em compras superfaturadas de respiradores”.
Nos últimos 20 anos, todos os governadores do Rio, à exceção de Benedita da Silva (PT), foram presos, afastados ou condenados. O Rio tem saudade de Brizola e Darci Ribeiro, que construíram os CIEPs, disse Waldeck. “O Estado e o município do Rio estão abandonados ao atraso e à desigualdade”.
Dani Monteiro (PSol), (na foto, abaixo), disse que o relatório aprovado “é necessário e é certo que Witzel falhou e escancarou sua inabilidade na relação com a Alerj. Vaidoso, caricato e egocêntrico, colhe agora os frutos amargos do que ele mesmo plantou. O Rio não merece a sua continuidade."
Renan Ferreirinha (PSB) citou as denúncias do MPF e a suposta participação do presidente do PSC, Pastor Everaldo em um esquema para desviar dinheiro da saúde. “Witzel se aliou a um grupo criminoso para ser eleito. O pastor Everaldo é acusado de comandar um esquema que desviou milhões dos cofres públicos. O governador afastado andou com muitos religiosos, mas não aprendeu uma importante lição bíblica: ’a soberba antecede a queda’".
A deputada Martha Rocha (PDT) citou as diversas irregularidades que os técnicos da secretaria de Saúde apontaram para a desqualificação da OS Unir Saúde, que Witzel requalificou por uma decisão própria. E concluiu: “A sensação que tenho é que o governador não sabe ler ou precisa de novo par de óculos. Os técnicos da Secretaria de Saúde apontavam 19 processos punitivos em face da Organização Social, como déficit de pessoal, inoperância de equipamentos e o não recolhimento de impostos. Como o Estado com uma enorme crise financeira aceita reconduzir uma OS que não recolhe impostos? O governador não teve dúvida de autorizar o pagamento de R$ 26 milhões. Witzel tinha ciência do que acontecia nos porões da secretaria de Saúde, que pode ser considerado crime hediondo”.
Ninguém poupou o governador, que sairá de cena carregando nas costas uma frase definitiva: “Quem rouba da saúde é assassino. Quem rouba na pandemia é genocida”.
Eleito na esteira da necropolítica bolsonarista fluminense, Witzel caiu em desgraça quando insinuou que poderia concorrer à Presidência da República sem consultar seu padrinho político, o presidente Jair Bolsonaro. O sucessor de Witzel, o vice Cláudio Castro (PSC), apesar de investigado, será poupado pelo esquema de Bolsonaro para servir aos interesses da família no Rio de Janeiro.