Maria Lúcia Verdi -
Mircea Eliade falou do “terror da história”, a nossa impotência frente aos fatos. Neste tempo em que vivemos sinto nas veias esse conceito. Mentiras por todos os lados, uma trágica comédia de erros digna da observação política de Shakespeare. Frente a isso, reajo com um quase desesperado desejo de que se restaure alguma respeitabilidade.
Sem ver alguma luz, me pergunto se algo novo (limpo, revolucionário) poderia nascer de um retorno ao sagrado enquanto experiência interior. A experiência interior com o sagrado que pode alavancar mudanças, transformar-se num instrumento político, como a entendiam Michel Leiris e George Bataille, entre outros.
O individualismo tendo sido sacralizado, hoje apenas o bem-estar de cada um interessa.
Praticamente só o que se vê, se lê e se ouve parte da disseminação de egos vorazes, incapazes da reflexão silenciosa, complexa e independente, sem subordinação. Nenhuma nostalgia de um sagrado religioso, mas, sim, de uma ética.
Neste Império do profano, em que sobreviver dignamente pode ser uma luta, com a mídia que nos invade, temos de suportar tomar conhecimento do que dizem arautos da ignorância, como o patético Bolsonaro, militar cristão, que carrega em seu nome um desajeitado Messias.
Me pergunto que pode ter de mundo interior essa figura pública?
Que experiência interior poderia fazê-lo mais consciente de seu anacrônico, perigoso, surreal discurso?
Ele não tem “segredo”, seu ser é absolutamente exposto em sua ideologia. Nenhuma terra para os indígenas, nenhuma terra para os quilombolas, todos os preconceitos.
O assustador é que tantas pessoas o apoiem, que os brasileiros estejam sendo capaz de tal cegueira. Que cristão pode ser Jair Messias Bolsonaro?
Que sensibilidade pode ter para se conectar com alguma palavra que tenha a ver com a revolução que a seu tempo provocou Cristo com seus ensinamentos?
Urge encontrar uma hermenêutica que explique que tempo histórico é este do Brasil de hoje, uma linguagem que provoque a ira, a ira sagrada.