Marcos Bagno –
Hoje publicamos a segunda e última parte das reflexões do linguista Marcos Bagno sobre a precarização (do planeta e da vida):
Outra forma crescente de precarização desses nossos tempos é a precarização do planeta, nada mais, nada menos. A cada ano, milhares de espécies animais e vegetais estão sendo extintas. Ao contrário das grandes extinções ocorridas na história passada da Terra, que foram causadas por grandes cataclismos geológicos, a atual onda de extinção tem como principal responsável a espécie humana.
A poluição desenfreada; a destruição crescente de ambientes naturais; o uso descontrolado de combustíveis fósseis; a derrubada das florestas; a caça indiscriminada e a pesca industrial, que impede a renovação dos cardumes; o aquecimento do planeta que eleva os níveis dos mares e provoca o derretimento acelerado do gelo dos polos – tudo isso está levando o planeta a um beco sem saída, e tudo isso tem como principal responsável, mais uma vez, o sistema capitalista, o ultra-neo-liberalismo, que só se interessa pelo consumo e pelo lucro que ele produz, que pratica a conhecida obsolescência programada: a tecnologia atual permitiria produzir, por exemplo, um telefone celular para durar dez ou quinze anos, mas é preciso convencer as pessoas a jogar fora o telefone comprado ontem porque só o que é vendido hoje é capaz de fazer funcionar os novos aplicativos. O telefone de ontem tinha só uma câmera, o de hoje tem duas, o de amanhã tem três. E assim vai se acumulando o lixo, que é a principal herança que a humanidade atual está deixando para as gerações futuras, se existir planeta para as gerações futuras.
Enquanto isso, no Brasil, um lunático que ocupa o cargo de ministro das Relações Exteriores vem a público dizer que o aquecimento climático do planeta é uma ilusão porque os medidores de temperatura são colocados muito próximos do asfalto. É com esse tipo de troglodita que estamos lidando.
A crise do clima deveria ser o primeiro item da pauta de qualquer projeto de salvação do planeta. Mas os interesses imediatos das pessoas riquíssimas impedem isso. Os Estados Unidos, que são os maiores poluidores do planeta, não assinam os protocolos internacionais de luta contra o aquecimento global. E agora, o Brasil, governado por um imbecil que bate continência para a bandeira americana, acompanha esse suicídio planejado. E o ministério do meio ambiente é controlado por um fascista de primeira hora, mais um terrorista que tem nas mãos um setor fundamental da nossa vida.
Por fim, como consequência de tudo o que foi dito antes, o neoliberalismo, ou o neofeudalismo, é responsável pela precarização da vida.
Nunca o mundo produziu tanto alimento e nunca tantas pessoas morrem de fome como agora. A devastação do meio ambiente, a precarização do planeta, evidentemente, provoca a perda de milhões de vidas humanas. As inundações cada vez mais frequentes, os tsunamis, os furacões que agora se sucedem em ritmo acelerado, as grandes secas, os desaparecimento de rios e lagos – é fácil imaginar o que isso representa de perdas de vidas humanas, especialmente nas regiões mais pobres, que são sempre as mais afetadas.
No caso particular do Brasil, a precarização da vida faz parte da nossa história desde sempre, é a espinha dorsal da formação da sociedade brasileira. A história do Brasil é a história do extermínio puro e simples de centenas de nações indígenas, da escravização de pessoas negras durante 350 anos, da criação consciente e programada de um abismo social que coloca o Brasil hoje entre os dez países mais injustos e desiguais do mundo. Mas todos esses indicadores sociais apavorantes não satisfazem aos atuais assaltantes do poder. O que se tem hoje no Brasil é uma política voltada e devotada para a morte. Os atuais governantes praticam uma necropolítica, a política da morte. Basta fazer uma rápida lista do que tem sido feito nos últimos seis meses.
A política de liberação do porte de armas só tem um objetivo: matar gente.
O recente desmantelamento do sistema de radares nas rodovias federais, no país em que 50.000 pessoas morrem por ano em acidentes nas estradas, só tem um objetivo: matar gente.
A liberação de mais de 160 produtos agrotóxicos, a maioria deles proibidos em outros países, só pode ter um resultado: matar gente. Em vez de ingerir comida com veneno, nós vamos passar a ingerir veneno com comida.
Dia desses o Supremo Tribunal Federal teve que declarar que mulheres grávidas não podem trabalhar em locais insalubres. Mulheres grávidas. De novo, uma política de morte.
A chamada reforma da Previdência é, no fundo, um projeto de extermínio de população. Se essa desgraça for aprovada, a grande maioria da população, submetidos à precarização do trabalho, não vai ter condição de sobreviver quando chegar o momento de se aposentar.
O Brasil tem a polícia que mais mata no mundo. Ela prende sem autorização, tortura e mata impunemente. Isso desde sempre. Mas agora o descontrole dessa força armada tem a bênção do governo federal. Um governo que se elegeu fazendo o elogio da tortura, incentivando toda sorte de violência, que usou como símbolo de campanha a mão imitando uma arma. No Rio de Janeiro, o governador do estado sobe em helicópteros e sai metralhando a esmo.
Um governo que criminaliza a educação e faz das professoras e dos professores seus principais inimigos é um governo genocida. Todo mundo sabe que o acesso à educação permite, mesmo num país injusto como o nosso, que as pessoas tenham melhores chances de trabalho e emprego. Mas o atual desgoverno, que é um adorador da morte, quer impedir ao máximo que as pessoas tenham acesso à educação. A paranoia privatizadora só pode beneficiar a quem já pode pagar para ter acesso aos bens e aos direitos sociais. Destruir a educação pública é destruir vidas.
E, por fim, o ministro da saúde acaba de anunciar que é contra o acesso universal das pessoas ao sistema do SUS, uma conquista histórica da população brasileira. É uma declaração explícita de que o importante é matar cada vez mais gente.
Sem saúde, sem educação, sem trabalho, sem o nosso petróleo, sem a nossa floresta, com o país voltando ao mapa da fome, fica difícil duvidar que não se trata de um projeto explícito de extermínio da população.
Esse é o tempo que nos tocou viver: a precarização do trabalho, a precarização da política, a precarização do planeta, a precarização da vida. No que diz respeito especificamente ao Brasil, eu só tenho uma coisa a dizer: ou nós derrubamos esse governo ou nós derrubamos esse governo. Não tem alternativa.