"A vida é de quem se atreve a viver".


De Longe Te Observo - filme venezuelano
De longe, observamos a Venezuela

Alexandre Ribondi -

O filme de Lorenzo Vigas, De Longe Te Observo (Desde Allá), em cartaz no Liberty Mall, serve para que os brasileiros, bombardeados por informações lançadas por morteiros e catapultas, vejam que a Venezuela não é apenas terreiro para lutas sociais, pobreza, perigo urbano e homofobia.

É também terra que produz uma obra narrada, fotografada e interpretada de maneira a mostrar, com a força de um impacto certeiro, os problemas que enfrenta a Venezuela: lutas sociais, pobreza, perigo urbano e homofobia.

Armando (o ator é o chileno Alfredo Castro) é um homem de meia idade, dono de um laboratório de prótese dentário, que passa seu tempo livre ocupado em duas tarefas: primeiro, seguir o pai, com quem parece nunca ter vivido, para observá-lo de longe. A segunda tarefa é aliciar rapazes pobres e perigosos das ruas de Caracas para que se exibam nus enquanto ele os observa, de longe, e se masturba.

O público compreende que esse homem silencioso e estranho tem ótima situação financeira porque paga bem. Acontece, no entanto, que um dia ele conhece Elder (o ator iniciante Luís Silva), chefe de uma gangue de bandidinhos, que finge aceitar o convite para, ao chegar na casa de Armando, derrubá-lo com um soco, roubar dinheiro, documentos e um bibelô da sala e fugir.

É a partir daí que os dois passam a se procurar, cada um a seu modo, e criam um relacionamento carregado de desejo, desprezo, ódio e, sobretudo, luta social: o rico e o pobre frente a frente, incapazes de conviverem, perigosos um ao outro, e onde o rico é capaz de cometer atrocidades silenciosas.

O final da história mostrada em De Longe Te Observo é capaz de deixar o público boquiaberto ou sem palavras pela compreensão que situações semelhantes acontecem todos os dias diante de nossos olhos: apreciar a beleza e a sensualidade de uma empregada doméstica, por exemplo, e ser incapaz de tratá-la com respeito.

Além disso, a câmera do filme (que ganhou o Leão de Ouro no Festival de Veneza em 2015) também é uma observadora de longe. Junto com as personagens, ela caminha em silêncio pelas ruas de Caracas, umas sujas e pobres, outras arborizadas e ricas. O ator Luís Silva, que tinha 19 anos quando encarnou o ladrão Elder, faz questão de informar que "também sou pobre, também sou das ruas, também cresci sem meu pai". 

Quando ele anda pela cidade, o requebro de suas cadeiras é um elemento essencial para o drama que se apresenta na tela: a sensualidade e o erotismo do pobre podem ser comprados pelo rico. Outro ponto marcante  são os silêncios e a imobilidade. Momentos assim servem de brecha para que o espectador penetre na história e a escarafunche, mesmo correndo o risco de achar mais crueldades.

De Longe Te Observo é baseado num conto do escritor e roteirista mexicano Guillermo Arriaga, conhecido dos brasileiros que gostam de cinema: é dele a autoria de Babel, 21 Gramas e Amores Brutos, todos dirigidos por Alejandro Iñárritu.

E, caso você esteja interessado em ver que a vizinha Venezuela é mais do que conflitos violentos entre a elite e as ruas, e que a sua produção cultural pode ser resultado justamente desses conflitos, não deixe de De Longe Te Observo.

Aliás, vá correndo.

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