Alexandre Ribondi –
A revista The Lancet, publicação inglesa científica sobre medicina, que teve sua primeira edição em 1823, não deixa de surpreender. Publicou, em 7 de maio de 2020, um editorial conciso, com concisão e com um conhecimento de causa bastante eficiente, sobre a passagem da pandemia pelo maior país das Américas Central e do Sul, o Brasil. E tirou uma conclusão que provoca estado de alerta no mundo: o combate a Bolsonaro e ao bolsonarismo é uma questão de saúde pública.
Com o título de Covid-19 in Brazil: “So what?” (Covid-19 no Brasil: “E daí?”), o artigo informa, já no primeiro parágrafo, que o Brazil detém o maior número de casos de infecções e de mortes no continente americano, depois dos EUA. Lista todos os problemas enfrentados nas grandes cidades, como Rio e São Paulo, fala da ameaça ao interior profundo, onde há “provisões inadequadas de leitos de UTI e de ventiladores”. E conclui com uma frase lapidar: “Mesmo assim, é provável que a maior ameaça à reação brasileira ao Covid-19 seja o presidente, Jair Bolsonaro”.
Para a revista, o presidente brasileiro “não se limita a semear confusão ou a abertamente ignorar e desencorajar as medidas sensatas de distanciamento físico e de bloqueio total à circulação de pessoas exigidos por governadores e prefeitos”. Como a política tem influência direta na medicina (e vice-versa), The Lancet se sente à vontade para relatar a saída do governo do ministro da Saúde, definido no artigo como “respeitado e admirado”, e do ministro da Justiça, “uma das figuras mais poderosas da direita, designado por Bolsonaro para combater a corrupção”.
A revista analisa a situação brasileira com a saída dos ministros como quem analisa uma doença grave: “Tal desordem no coração da administração é um transtorno mortal no meio de uma emergência na saúde pública e indica também que a liderança no Brasil perdeu sua bússola moral, se é que jamais teve uma”.
The Lancet se vale do Coronavírus e seu flagelo para traçar o quadro da sociedade brasileira ou, sem dar-lhe o nome, do capitalismo mundial. Fala da profunda injustiça social existente no Brasil e na extensa maioria das nações. Cita as favelas, onde em média há três pessoas por cômodo. A população indígena está também ameaçada, “desde antes da epidemia porque o governo tem ignorado e até mesmo encorajado a mineração e o desmatamento ilegais da floresta Amazônica”. Para os cientistas e ativistas citados pela revista, “o desafio é antes de tudo político, o que requer um comprometimento contínuo por parte da sociedade brasileira como um todo para garantir o direito à saúde de todos os cidadãos brasileiros”.
The Lancet sugere que o País se una para dar uma resposta clara ao absurdamente monstruoso “e daí?” de Bolsonaro. Segundo o artigo, “o presidente deve promover uma mudança radical no seu curso ou ser o próximo a sair”.