Maria Lúcia de Moura Iwanow -
É preciso que, pelo menos as pessoas que se dizem, ou se acham de esquerda, abram os olhos e parem de ser massa de manobra dos donos de bares e restaurantes que as convenceram de que se aumentar o som dos bares, os músicos terão empregos! Essa é uma sandice que não resiste ao mais simples argumento.
Pra começar, não existe uma Lei do Silêncio. Existe a Lei 4.092/98, que dispõe sobre a poluição sonora e foi construída com base nos parâmetros da Organização Mundial de Saúde. Leiam, informem-se!
Quando a Lei foi aprovada, os donos de bares e restaurantes, para não fazerem o isolamento acústico previsto, demitiram os músicos. Hoje, acham gente pouco informada, ou mal intencionada, para dizer que quem é contra a mudança da Lei é de direita.
De direita, o cazzo! De direita é quem, entre outras coisas, ignora a realidade social dos que moram na periferia, que não têm sequer direito ao descanso, ao repouso, por causa do barulho ensurdecedor dos bares, do som automotivo, dos shows, das raves, tudo colocado num nível de decibéis insuportável ao ouvido humano.
Os defensores da modificação, conscientes, ou funcionando como simples massa de manobra ou inocentes úteis, mascaram o lobby esperto de donos de bares que não querem gastar com a preparação acústica dos estabelecimentos prevista legalmente.
O que quer o lobby é mudar uma lei que nunca funcionou para quem não mora em área nobre de Brasília! Eu não moro e sei do que estou falando! E posso afirmar que é horrível, estresse total. Não quero isso pra ninguém. E conheço muita gente que mora em lugar absolutamente sossegado que acha bacana barulho de bar no ouvido alheio!
“Ouvir música para os outros” é autoritarismo, falta de educação e porralouquice! Imagine, conviver, obrigado, com uma música alta! (Com mau cheiro seria legal também, não?) É não poder ler, não poder dormir, não poder assistir a um filme, não poder ouvir o silêncio quando se quer! As pessoas sabem o que é ser perturbado por uma música alta que não se escolheu, em dia, noite e hora que não se escolheu ouvir? Isso não é democracia.
E só para ninguém esquecer, a música alta que inferniza nossas vidas, na maioria dos casos, é mecânica e muito ruim. Além disso, qual a necessidade de um bar de menos de 30 metros quadrados colocar música para uma quadra inteira ouvir?
A propostinha do lobby é simplista e um deputados ou vários, ao encampá-la, apenas mostra(m), além de despreparo, falta de sintonia com os anseios da maioria da população e superficialidade na análise da questão.
Eu até iria mais longe, mas deixa pra lá. Um dia os verdadeiros motivos dessa baboseira vão aparecer.
Aumentar os decibéis não resolve e não são apenas os bares que precisam de regulamentação adequada nesse quesito! Os abusos estão por toda a parte, não há fiscalização a não ser, é claro, nas 'áreas nobres", embora tenha amigas que digam que, na Asa Sul, muitas vezes não conseguem dormir devido ao barulho que vem - pasme! - dos clubes à beira do Lago.
Então, quando canalha souber que pode aumentar o som ainda mais, imaginem!
No DF, principalmente fora das “áreas nobres”, o som automotivo inferniza a vida das pessoas, a qualquer hora do dia ou da noite, simplesmente porque o GDF não fiscaliza a aplicação do Código Nacional de Trânsito.
E se podem ver carros com som que balançam a estrutura das casas, das janelas, com bebê de colo dentro! Multas não faltam! Mas garantir saúde auditiva cumprindo a lei, imagine, de jeito algum!
O correto seria que o DF desse o exemplo com uma lei que regulamentasse os níveis de decibéis para toda a atividade sonora, não apenas com uma propostinha ridícula de aumentar decibéis para bares.
Pergunte, por exemplo, aos/às trabalhadores/as de lojas de shoppings, por exemplo, como é que estão seus tímpanos no final do dia, depois de 12 horas de trabalho, ouvindo música estridente, alta, ruim! Chegam surdos em casa. Mal podem ouvir os filhos, a família! Quem se importa, não é?
Experimente pedir ao gerente para baixar o som e ele vai-lhe responder que a música vem da rádio da firma e que o volume é decidido pela chefia. Quem ali trabalha que se dane! Ah, a música é, sempre, estrangeira e vagabunda.
Nada justifica um show na Esplanada ser ouvido nas duas Asas de Brasília. E a saúde auditiva dos presentes? Isso é uma questão de saúde pública. Mas o poder público está se lixando para isso. Seus representantes não são afetados por esse tipo de problema. No cinema, por toda a parte, o som é abusivo. Vai-se a uma festa de casamento, ou de criança e não se consegue conversar! As pessoas, ensurdecidas, exigem um som cada vez mais alto para poderem “ouvir”.
Há centenas de pessoas, musicistas, produtores culturais, compositores, representantes da comunidade que deveriam ser chamados para propor regulamentação para cada espaço de atividade sonora. Aumentar decibéis para bar é cara de pau, insensibilidade social e irresponsabilidade! Não sustentamos uma Câmara Distrital para ver isso.
E, mais uma mentira: os espaços da música – assim como o de outras manifestações culturais - não sumiram por causa da delimitação dos decibéis. Sumiram porque não há política de incentivo à cultura. Sumiram porque não são prioridade para os governos que se vêm sucedendo neste DF.
Saudável, ainda, lembrar que delimitação de decibéis não é vontade do legislador; é recomendação da Organização Mundial de Saúde, preocupada com o aumento do índice de surdez não congênita, que já atinge 10% e avança, provocada pelo barulho urbano que já é o suficiente. A legislação visa a proteger, principalmente, quem está perto da emissão do som.
Mas tem gente que acha legal, aos sons urbanos que já são demais, acrescentar um som de uma música indesejada.
Meigo, não? Democrático, né? A música tem que ser ouvida por quem escolheu ir ao bar, ao show, à sala de música ouvi-la e não por quem não o fez. É simples!