Geniberto Paiva Campos -
A elite brasileira tem sérios problemas em aceitar, ou mesmo assimilar, certos conceitos na área da educação. E se sente tranquila e segura para proclamar as maiores tolices, ditas com ares doutorais. Sem perceber, sequer desconfiar, as asneiras que está dizendo, mesmo quando involucradas em falso conteúdo ideológico.
Após cometer estultice imperdoável, ao defender a “Escola sem Partido”, resolveu ir um pouco mais além em suas aberrações ideológicas, e diante da falta de um alvo melhor, desferiu um ataque frontal – e descabido – ao professor Paulo Freire.
Na esteira da onda neofascista que toma conta do país, após a usurpação do Poder pelo Neoliberalismo, lançaram, simultaneamente, em livro e em projeto no Congresso Nacional, críticas infantis ao educador brasileiro, reconhecido mundialmente. E decidiram “cassar” o título de Patrono da Educação Brasileira do professor Paulo Freire.
E aí cometem tolices inacreditáveis. Motivados pela sanha destruidora dos fascistas, reduzem sérios problemas da área da Educação à sua expressão mais simples. Macaquinhos na loja de louças, imaginam poder destruir currículos e biografias ao correr do martelo.
E tentam, em vão, interpretar o pouco que sabem sobre a História Contemporânea do país. E à falta de argumentos minimamente consistentes, apelam para a grossura, a boçalidade e a truculência.
Desde quando, com suas camisas amarelas, carregavam cartazes em passeatas domingueiras onde diziam, com certo ar de enfado e preconceito: “Basta de Paulo Freire!”
Um dos efeitos deletérios do Brasil Colônia foi a “Chaga do Analfabetismo”, com a qual convivemos durante séculos.
No alvorecer do século 20 começaram as manifestações de inconformismo de educadores brasileiros com a dita “chaga do analfabetismo” e com os desafios do sistema educacional.
Em 1932, o movimento “Pioneiros da Educação”, reunindo cerca de 30 integrantes da elite intelectual brasileira, lançou um manifesto pela Educação Nova, redigido por Fernando Azevedo.
O manifesto, assinado, entre outros, por Anísio Teixeira, Cecília Meirelles e Roquete Pinto, denunciava a educação vigente na 1ª República (1889/1930) como excludente, privilégio de ricos, cabendo à maioria da população, afastada das escolas e universidades, enfrentar o trabalho duro e sem trégua.
Sendo negado o direito à participação direta no processo democrático, através do voto. Voto de analfabeto somente era permitido se o indivíduo possuísse “renda e títulos de propriedade”. (A elite, mesmo iletrada, sabia defender seus interesses).
A erradicação do analfabetismo veio a se constituir em objetivo e meta de vários governos. De todos os matizes e tendências. A série histórica publicada no Portal do Inep, intitulada “Mapa do Analfabetismo no Brasil” (1) mostra claramente a fundamental preocupação com esse desafio. São várias as tentativas de enfrentamento do problema:
1) 1947 – Governo Dutra: “Campanha de Educação de Adolescentes e Adultos”;
2) 1958 – Governo JK: “Campanha Nacional de Erradicação do Analfabetismo”;
3) 1961 – CNBB: “Movimento de Educação de Base”;
4) 1964 – Governo João Goulart: “Programa Nacional de Alfabetização” (Método Paulo Freire);
5) 1968/1978 – Governos do Período Militar: – “Movimento Brasileiro de Alfabetização”; MOBRAL
6) 1985 – Governo Sarney: “Fundação Nacional de Educação de Jovens e Adultos “/ EDUCAR;
7) 1990 – Governo Collor: “Programa Nacional de Educação e Cidadania” /PNAC
8) 1993 – Governo Itamar Franco: “Plano Decenal de Educação para Todos”;
9) 1997 – Governo Fernando Henrique: “Programa de Educação e Cidadania”.
Tanta preocupação, embora dispersa, resultou na significativa redução, em um século, do contingente proporcional de analfabetos na população brasileira: De 67% em 1900 para 10%, no ano 2000. (1)
Paulo Freire tem muito a ver com estes resultados. Foi o educador pioneiro, que ousou aplicar o método que levaria o seu nome. Inicialmente em Angicos/RN, no início dos anos 1960.
Em sequência nas Rocas, bairro periférico de Natal/RN. Tendo como agentes alfabetizadores alunos da UFRN. Com êxito inegável na alfabetização de adultos. Em 40 horas...
O Método Paulo Freire de Alfabetização prescindia do uso de cartilhas. E a partir de pesquisas do universo vocabular da comunidade, era escolhida uma palavra-chave, que após decomposta em sílabas, assimilado o seu significado, eram utilizadas para compor novas palavras.
Além desse aprendizado básico de alfabetização os “alunos” eram estimulados a entender o seu contexto cultural – família, trabalho, espaço urbano, seu país, o mundo – e sua inserção nesta realidade.
O espaço de aprendizado era denominado “Círculos de Cultura”. E colocava o cidadão alfabetizado em sintonia plena com a realidade em que estava inserido.
Vários segmentos da elite torciam o nariz, farejando subversão. Imaginado que aqueles até então mantidos nas trevas da ignorância poderiam ganhar consciência da sua cidadania e, gradativamente, se transformar em indivíduos conscientes, potencialmente capazes de lutar pela sua libertação (à época, uma palavra carregada de simbolismo. E suspeição...).
A fama merecida de Paulo Freire como Educador ganhou o mundo. “(...) E passou a ser reconhecido internacionalmente como um dos mais importantes educadores do século 20;
- Por suas reflexões e publicações, além de vários títulos de doutor “Honoris Causa” que lhe foram outorgados por universidades de vários países do mundo, portanto, por sua reconhecida autoridade e atualidade nos diferentes campos do conhecimento, Paulo Freire vem sendo considerado um dos mais importantes pensadores do século 20;
- Por suas experiências educacionais e por seus escritos, Paulo Freire tem sido mundialmente reconhecido como autor de um legado intelectual e educacional que vem sendo aplicado em todos os níveis, modalidades e graus de ensino, em diferentes lugares do mundo;
- Em recente pesquisa sobre trabalhos científicos, realizada pela London School of Economics, Paulo Freire foi considerado um dos pensadores mundialmente mais lidos e mais referenciados, sendo que sua obra mais conhecida, “Pedagogia do Oprimido” (1968) está entre os livros mais citados nas ciências sociais e entre os 100 livros mais pedidos e consultados por universidades de língua inglesa.”
Temos de concordar com os camisas amarelas: Basta de Paulo Freire!