Betty Almeida (*) –
A socióloga Maria Sena, em carta aberta ao cineasta José Padilha (leia aqui a carta), corrobora sua defesa em relação aos filmes Tropa de Elite 1 e 2 e porque vai filmar a história de Marielle, embora seja branco. Por isso, diz Maria Sena, José Padilha não é fascista. Mas por outras razões, afirma que ele é. E ela aponta outros trabalhos do diretor, onde sua má-fé criptofascista pode ser vista pelos mais atentos. Seu prestígio e seu voto, lembra ainda Maria Sena, ajudaram a eleger o atual presidente.
Vi Tropa de Tropa de Elite 1 na televisão, não tive estômago para ver o 2. É verdade que José Padilha tem em seu currículo filmes como Os Carvoeiros (1999) e Ônibus 174 (2002). Mas lamento que a história de Marielle irá ser contada por ele. Quem sabe, nos surpreenderá.
O fato é que no Brasil está surgindo uma intelectualidade inclinada, de alguma forma, à direita, ou manifestamente apoiadora da direita. Por muito tempo, o brilho de nossos intelectuais de esquerda ofuscou a tosca e raquítica produção da direita, com exceções como Nelson Rodrigues, que não era propriamente político.
Mas hoje, com fascistas e criminosos comuns na Presidência, Câmara e Senado, tudo o que pende à direita ou sugere crítica à esquerda tem palco e é publicizado. Obstáculos de todo tipo ao lançamento de um filme como Marighella destinam-se a desacreditar denúncias de censura. A musa popular só inspira, ao que parece, o rap, de público restrito.
Atravessaremos, ao que parece, uma longa noite de obscurantismo e esterilidade cultural.
Assim, que brote um novo teatro da herança de Augusto Boal e José Celso Martinez Corrêa, que Sérgio Ricardo, Edu Lobo, Geraldo Vandré inspirem novos compositores populares, que Drummond e João Cabral despertem jovens poetas, que os espíritos de Graciliano Ramos e Antonio Callado iluminem novos literatos, que o Cinema Novo e documentaristas como Eduardo Coutinho, Vladimir Carvalho e Silvio Tendler conduzam as câmeras de jovens cineastas.
Mas, sobretudo, que vereadores e deputados estaduais que os partidos de esquerda conseguirem eleger se aproximem do povo iludido pela doutrinação do whatsapp, instagram e youtube, que os entregadores se politizem e se organizem, que os identitarismos, a luta pelo ambiente e pela causa indígena se consolidem como forças de oposição à intolerância, que os jovens voltem a querer ficar do lado dos fracos e oprimidos. Porque tantos que tiveram energia para lutar contra a ditadura hoje começam a se sentir velhos e impotentes.
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(*) Betty Almeida, doutora em Eletroquímica, é biógrafa de Honestino Guimarães. Publicou Paixão de Honestino, pela Editora UnB, em 2016.
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