"A vida é de quem se atreve a viver".


É hora de discutir a moradia no centro da cidade, para as mais diversas faixas de renda, de forma complementar às demais atividades existentes. Brasília precisa voltar a ser moderna de novo.
Morar no centro é fazer Brasília moderna de novo

Bruno Ávila, Manuella de Carvalho Coelho e Wilde Cardoso Gontijo Júnior (*) –

Nos próximos meses, Brasília completará 60 anos. Talvez o ícone maior do urbanismo modernista, nossa cidade, no entanto, já não respira os modernos ares dos anos dourados.

Na década de 1960, o modernismo começava a dar sinais de falência nas maiores cidades do planeta, mas, no Brasil e para muitos brasileiros, Brasília, símbolo de um país que rumava para o futuro como grande potência mundial, era onde as ideias mais brilhantes e o modo de vida mais moderno poderiam encontrar refúgio. O modernismo e o moderno se fundiam nas cabeças dos moradores da nova capital do país.

Esse modernismo, no entanto, impôs à cidade duas grandes características. A primeira era o zoneamento dos usos definindo a ocupação da cidade – as atividades seriam “organizadas” no espaço de forma a criar nichos para hospitais, hotéis, bancos, autarquias, garagens, gráficas e comércio em geral. A segunda estabelecia o modo de transporte rodoviário como a forma predominante de deslocamento pelas “vias” da cidade.

Apenas a zona residencial das superquadras parece ter escapado dessa rígida organização: ali se projetaram prédios para moradia, mas também escolas, bibliotecas, postos de saúde, igrejas, clubes sociais, cinemas, postos de combustível, lojas de conveniência e comércio local – quase sempre diversificado. Nesse espaço também se permitiu às pessoas da vizinhança circular a pé em todas as direções por caminhos verdes, calçadas largas e com mínima interferência dos automóveis.

Os anos se passaram e essas áreas residenciais parecem cada vez mais vivas. Além da ocupação planejada, quiosques diversos se espalham pelas superquadras onde podem ser encontrados sapateiros, costureiras, chaveiros, bancas de revista, centros culturais, cachorros quentes, etc. As árvores cresceram, as pessoas fazem jogging ou passeiam com seus pets nas calçadas. Os pilotis ainda são praticamente de livre circulação e a segurança das pessoas é bastante razoável nos diversos períodos do dia e da noite.

Por outro lado, o centro da cidade, com espaços destinados a usos específicos, não se comporta da mesma forma. Vibrante durante o horário comercial em dias úteis são praticamente desertos durante a noite. Durante os finais de semana, a desocupação ocorre em todos os horários, exceção feita aos setores de diversões norte e sul.

Diagnóstico recente do centro da cidade mostra outras faces dessa situação. Cerca de 5.000 salas estão vazias nos vários setores, 1.600 somente no Setor Comercial Sul onde sete edifícios estão totalmente desocupados. São 70 os lotes para edifícios que se encontram vazios em todos os setores centrais. Concentrando muitas atrações comerciais, o centro da cidade não possui, mesmo com tais vacâncias, vagas para estacionamento de automóveis.

Os carros não cabem nos espaços oficiais e quase sempre invadem os espaços verdes ou as calçadas dos pedestres. As ruas e becos são ocupados por pessoas que vivem na rua e muitas áreas se transformaram em buracos para o consumo de drogas inviabilizando a circulação livre e segura das pessoas.

O centro do Plano Piloto está envelhecendo rápido demais e não cabe mais no conceito de cidade moderna – apesar de modernista. Sua área comercial mais densa já não se diferencia do centro das grandes cidades brasileiras – Jane Jacobs certamente incluiria Brasília no seu célebre livro, talvez invertendo seu título para Vida e Morte de Grandes Cidades.

É preciso fazer reviver o centro de Brasília incorporando as pessoas durante todo o tempo na vida de seus espaços urbanos. Um exemplo de sucesso existe aqui e pode ser nossa referência: as superquadras, onde os usos múltiplos estão cada vez mais presentes e a modalidade de transporte principal pode ser o andar a pé ou de bicicleta.

Todos nós conhecemos pessoas que prestam serviços trabalhando em seus apartamentos nessas zonas ditas residenciais e já não precisam de carro para o deslocamento diário.

É hora de discutir a moradia no centro da cidade, para as mais diversas faixas de renda, de forma complementar às demais atividades existentes, dinamizando seus lugares para a ocupação segura das pessoas. Brasília precisa voltar a ser moderna de novo.

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(*) Bruno Ávila, arquiteto e urbanista, do Instituto de Urbanismo Colaborativo (Courb), Manuella de Carvalho Coelho, arquiteta e urbanista, do Movimente e Ocupe seu Bairro (MOB) e Wilde Cardoso Gontijo Júnior , engenheiro, da Associação Andar a Pé – o Movimento da Gente (Andar a Pé).

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