Romário Schettino –
A deputada terrivelmente bolsonarista Bia Kicis (PSL-DF), atual presidente da Comissão de Constituição e Justiça da Câmara dos Deputados, foi condenada no Tribunal de Justiça do Rio, a pagar R$ 41,8 mil ao ex-deputado Jean Wyllys (PSOL-RJ) por divulgação de fake news.
Aliás, essa mesma deputada, premiada com a CCJ, é investigada em inquérito do Supremo Tribunal Federal (STF), que apura a disseminação de informações falsas, e já foi convocada a prestar depoimento sobre sua participação em atos antidemocráticos.
O feitiço começou a virar contra a feiticeira desde que o ministro Gilmar Mendes derrubou a decisão judicial que havia condenado o ex-deputado Jean Wyllys a pagar indenização de R$ 40 mil à mesma deputada Bia Kicis.
Ao analisar um recurso do ex-deputado, Gilmar Mendes escreveu que aquele caso estava relacionado ao exercício do mandato e que condená-lo à indenização consistiria em violação de suas prerrogativas parlamentares, estabelecidas pela Constituição.
A foto, que deu origem ao processo de Kicis contra Wyllys, segundo Gilmar, “possui natureza estritamente política”.
Fake news comprovada
A situação agora é outra. O juiz Fernando Rocha Lovisi, do TJRJ, concluiu que Bia Kicis compartilhou uma notícia falsa (fake news) em que associava Jean Wyllys a Adélio Bispo, autor do atentado à faca sofrido pelo presidente Jair Bolsonaro durante a campanha eleitoral de 2018.
O juiz alertou em sua sentença que Bia Kicis “extrapolou seu direito ao caluniar o autor (Jean Wyllys), sem qualquer base verossímil, de ter participado da tentativa de homicídio do Presidente da República”.
Depois de descrever o fenômeno das fake news na atualidade, o juiz determinou a remoção dos conteúdos publicados pela deputada em redes sociais e determinou que ela publique uma retratação a Wyllys, sob pena de multa de R$ 20 mil em caso de descumprimento.
No caso da ação de Wyllys a atitude de Bia Kicis não se limitou à crítica política nem demonstrou a veracidade de suas acusações. Segundo o juiz, a deputada “publicou palavras com o intuito de caluniar o autor, sugerindo estar ele associado ao crime de tentativa de homicídio do Presidente da República. Usou o ardil de supostamente haver provas e teve como única intenção causar danos ao [ex-deputado do PSOL]”.
Como se sabe os dispositivos constitucionais, especialmente o artigo 220, determinam que a liberdade de expressão e a manifestação do pensamento são livres, mas não são sem limites.
O juiz citou, em sua sentença, estudo do professor Gustavo Binenbojin (Fake News como externalidades negativas), para dizer: “Como a poluição ambiental, as fake news devem também ser entendidas como uma espécie de falha de mercado: do mercado digital de livre difusão de informações, ideias e opiniões. Trata-se de uma modalidade de externalidade negativa, que propicia a obtenção de lucros abusivos por alguns grupos mediante prejuízos econômicos e políticos socializados entre todos. O custo das notícias fraudulentas transcende àqueles a quem elas se dirigem como alvos, alcançando, por vezes, a saúde pública, a economia popular ou as instituições democráticas. Trata-se de um custo externo à liberdade de expressão”.
O juiz ainda vai mais longe: “A postagem da ré (Bia Kicis) não tem qualquer relação com o exercício de seu mandato, com ideias, propostas, fiscalização ou qualquer outra função exercida no Congresso Nacional e, portanto, não está abrangida pela imunidade constitucional”.
Da decisão ainda cabe recurso.