"A vida é de quem se atreve a viver".


Geniberto Paiva Campos
Podres poderes ou o desmonte de um país

Geniberto Paiva Campos -

Os brasileiros assistem, com perplexidade e indignação, o declínio inexorável da Constituição Cidadã de 1988 que deu início à Nova República. Cujos postulados constituíram os alicerces para a retomada da democracia, para a conquista de direitos sociais e para a construção de uma sociedade civilizada.

Já se percebe o tropel do autoritarismo, o qual retorna envolto no “manto diáfano” e enganador do “combate à corrupção”. O velho tema, eternamente usado para iludir os brasileiros, que comporiam uma espécie de “confraria de tolos”.

Sempre disposta a acreditar que a “corrupção”, tema habilmente manipulado pela grande imprensa, é o mal do Brasil. Um bicho de sete cabeças a ser eliminado a todo custo. Nem que para isso seja necessário o desmonte do país. E a quebra do Estado de Direito.

A estrutura econômica, a cadeia produtiva, o sistema educacional e científico, o atual núcleo do poder, precisam ser destruídos, para que, sob os escombros, surja num passe de mágica, o “Novo Brasil”. Livre, enfim, desse estranho mal, a “corrupção” que lhe corrói as entranhas.

De que modo esse discurso, tolo e de pura enganação, conseguiu convencer os brasileiros é um mérito a ser creditado a uma imprensa livre, soberana e sem qualquer tipo de limites.

Sem nenhum compromisso com a verdade factual (ou a “pós-verdade”, o mais recente neologismo). Sempre disposta a enganar. Transformando um povo alegre e inteligente em autômatos obedientes, que reagem a estímulos predeterminados.

“Não perde quem aposta na ingenuidade do povo”. Trata-se de uma frase antiga, carregada de verdade. A mídia nativa fez as suas apostas. E está a colher os frutos de uma manipulação grosseira, por demais tosca para ser levada a sério. Mas que funciona entre nós, como se percebe.

Segmentos da sociedade brasileira foram preparados para responder prontamente aos comandos midiáticos: ocupam ruas e avenidas, sempre aos domingos; vestem camisas amarelas da seleção de futebol do Brasil (eles torcem contra, às vezes); batem panelas, quando indicado; e repetem prontamente palavras de ordem, as mais esdrúxulas, quando seus mestres ordenam. Por aí vai caminhando a desconstrução do país. Fácil, extremamente fácil.

Um dos problemas desse tipo de manipulação é que atinge não somente o seu público alvo específico. Outros segmentos sociais são também influenciados. E, de repente, forma-se uma espécie de “conluio do bem” (para fazer o mal) no qual a população, quase sem perceber, se associa a segmentos importantes dos poderes republicanos: a Imprensa, ou o quarto poder; a classe política; segmentos do judiciário e do executivo, formando uma espécie de conspiração para acabar com a corrupção, na qual as primeiras vítimas – além da verdade – são a democracia, a liberdade e o Estado de Direito.

Uma outra frase, atribuída ao Conselheiro Acácio, diz: “o problema das consequências é que só vêm depois...” E estas começam a aparecer, até mais cedo do que se esperava.

Afastada em definitivo a presidenta Dilma, num dos processos políticos mais sórdidos e vergonhosos da nossa história, apelidado de “impeachment” (na realidade um Golpe de Estado que não ousou dizer o seu nome), os politicamente ingênuos imaginaram que estaríamos no melhor dos mundos.

Um Nirvana verde amarelo. Em poucos meses de um governo frágil, ilegítimo e vacilante, de inteligência limitada, os que usam mais de dois neurônios para pensar, perceberam que não bastava afastar o Partido dos Trabalhadores da presidência da República, como lhe garantiram os conspiradores.

É séria, seríssima, a situação política e econômica do país. E, como pano fundo, a crise institucional gravíssima. Uma espécie de briga de rua – simultânea - entre os 3 poderes, criando uma espécie de vácuo entre o legislativo, o judiciário e o executivo, cujo desfecho é imprevisível.

Provavelmente uma disputa primária, talvez entre primatas, que não apontará vencedores. Mais uma vez, com a imprensa manipulando os fatos para favorecer um dos lados da disputa, sempre a favor de restrições às liberdades democráticas. Uma permanente aposta no caos. E nos regimes ditatoriais.

Onde foi criado um “estado de exceção, em que o direito está suspenso e a tendência dominante gerou um novo consenso, o da covardia. ”

O que fazer? - Essa a pergunta que atormenta os democratas brasileiros. E os que torcem por uma saída pelos caminhos democráticos e da alta negociação política.

Sonham com a urgente retomada da Política, assim com P maiúsculo, que possa permitir retirar o país desse abismo profundo, no qual foi arremessado por atores inexperientes, apressadinhos. Sempre crédulos nas matérias dos jornais, revistas, rádios e TVs, assumidas por eles como verdades absolutas.

A história política recente do Brasil mostra tentativas frustradas de criação de “frentes políticas” para combater ditaduras e criar condições para a retomada da democracia.

Esse fato ocorreu, por exemplo, em 1968, com a “Frente Ampla”, imaginada pelo ex-governador Carlos Lacerda, com adesões claras, embora vacilantes, de JK e Jango. Além de outros políticos e de lideranças militares. A Frente se dissolveu com a decretação do AI/5, em 13 de dezembro daquele mesmo ano.

Por outro lado, a transição do período ditatorial, que durou 21 longos anos, para a “Nova República “, em 1985, teve pleno êxito. Desde que pode contar com a adesão das mais expressivas lideranças políticas, o grupo reunido em torno das “Diretas Já”: Tancredo Neves, Ulisses Guimarães, Leonel Brizola, Franco Montoro, Marco Maciel, José Sarney Fernando Lyra, Aureliano Chaves, Fernando Henrique Cardoso, Marcos Freyre, Teotônio Vilella e tantos outros que construíram uma frente política amplíssima. E trabalharam, com dedicação e competência política, para a construção da Nova República.

A transição do regime ditatorial para a democracia, no entanto, vinha amadurecendo desde o início da década de 1980, e se completou com a eleição de Tancredo Neves no Colégio Eleitoral. O ciclo dos presidentes-generais estava encerrado.

O que acontece neste ano da graça de 2016 – que para muitos teve início em 2013 – constitui um dos maiores desafios políticos da história recente do país. E são poucos os sobreviventes dos grandes homens, criadores da “Nova República”. Agora, sob grave ameaça.

Os implacáveis inimigos do Brasil e da democracia agora se escondem. Fazem seus conluios e conspiram em terras distantes. Têm os seus representantes locais travestidos de combatentes patrióticos, mas muitos deles são “falsa bandeira”.

É preciso separar o joio do trigo. Trata-se, portanto, de uma luta difícil, cujo campo de batalha é controverso. E escorregadio.

As frentes de resistência democrática estão ativas e dispostas a ir à luta. Há que se criar, no entanto, núcleos estratégicos de inteligência para que a batalha se torne mais igual e mais justa. Enfim, combatendo o bom combate.

Todos estão convocados à luta pelo Estado de Direito, pela liberdade, pela democracia, pela defesa da soberania nacional!

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